Na próxima segunda (25), o jornalista Naief Haddad e o fotógrafo Bob Wolfenson lançam o livro "África em São Paulo", fruto de um "encontro fortuito" que aconteceu há seis anos. O lançamento será no Museu de Arte Brasileira da Faap, onde acontece outra versão da mostra que aconteceu dois anos atrás.
Essas são as palavras usadas por Wolfenson ao lembrar um episódio que aconteceu no centro de São Paulo em maio de 2018. Ao lado de Haddad, ele procurava personagens para uma reportagem da Folha sobre o mercado de trabalho e acabou conhecendo Mama Diop, senegalesa pioneira no comércio de produtos africanos nos arredores da praça da República.
"Mama é dessas personalidades irresistíveis: carismática, elegante e sempre atenta a todos que estão ao seu redor, especialmente seus conterrâneos", conta Haddad.
Ela se tornou a primeira personagem do projeto que reúne histórias de africanos que escolheram São Paulo como lar e, agora, virou capa do livro que surgiu da empreitada em dupla.
Para Wolfenson, a foto da capa sintetiza toda a iniciativa. "Ela tem essa questão da indumentária ancestral, mas também uma vivacidade, uma alegria. Não é só miséria, não é só inadequação, não é só expatriamento, é orgulho."
A partir de Mama Diop, os dois passaram a conhecer e retratar histórias de outros imigrantes africanos, com a preocupação de fugir de estereótipos e generalizações sobre o continente.
Entre os entrevistados, Haddad destaca a história de Madalena Nanque, que chegou ao Brasil na década de 1990 deixando a comunidade papel em Guiné-Bissau, onde era princesa. Em São Paulo, passou a viver sem as mordomias que costumava ter, se formou em teologia e pedagogia e hoje trabalha em uma loja no Brás.
"‘África em São Paulo’ teria sido um fracasso se nos deixássemos levar por ideias pré-concebidas", aponta Haddad. "Vivemos em uma sociedade racista, que muitas vezes nos impede de ver a África em sua complexidade. Claro que existem locais com miséria e países em conflitos intermináveis, mas há também manifestações culturais riquíssimas e específicas de cada país ou região."
"Não existe uma só África, como muitos de nós costumamos acreditar", afirma o repórter especial da Folha.
Tudo a Ler
Receba no seu email uma seleção com lançamentos, clássicos e curiosidades literárias
No lado visual, Wolfenson se preocupou em incluir, e não rotular, os imigrantes. "Guardamos todas as questões da identidade e tradição e deixamos para os próprios personagens decidirem como queriam aparecer, se com a roupa de sua ancestralidade ou com as roupas atuais", conta o fotógrafo.
Para Haddad, São Paulo se torna uma cidade bem mais interessante quando abre espaço para imigração africana. "Do ponto de vista acadêmico e intelectual, o Brasil ganhou muito com a presença do antropólogo congolês Kabengele Munanga, um dos maiores conhecedores da cultura africana nas nossas universidades".
Ele também destaca a camaronesa Melanito Biyouha, dona do restaurante Biyou’z, o escritor angolano João Canda e a também camaronesa Mama Louise, que se tornou designer de joias depois de se mudar para a cidade.
A pesquisa nas ruas foi transformada em uma exposição que aconteceu no Museu da Imigração em 2022. Agora, com patrocínio do Instituto Olga Kos, o projeto foi transformado no livro "África em São Paulo".
No evento, além de fotos de Wolfenson, também serão exibidas imagens produzidas em uma oficina realizada pelo Instituto Olga Kos e inspirada no trabalho de Wolfenson e Haddad.