Ligia Cardoso Valente, Mariana Rodrigues e Melissa Takai Thomé: Transação tributária como solução estratégica para empresas em recuperação judicial

há 17 horas 1

Como se sabe, a recuperação judicial é um instrumento jurídico, previsto na Lei nº 11.101/2005, posteriormente aprimorado pela Lei nº 14.112/2020, que tem como propósito viabilizar a superação da crise econômico-financeira pelo devedor que possua potencial para retomar a viabilidade econômica e sua função social. Seu objetivo central, portanto, é preservar as operações da empresa, garantir a manutenção de empregos, impulsionar a economia e, simultaneamente, assegurar que os credores sejam satisfeitos.

Quando o devedor decide por ingressar com o pedido de recuperação judicial, esse pode enfrentar desafios significativos. Um dos maiores é justamente demonstrar a viabilidade de suas atividades, para convencer credores e o judiciário de sua capacidade de superação. Soma-se a isso a dificuldade de acesso a crédito novo, a desconfiança do mercado e o possível impacto negativo na reputação empresarial.

Entre as dívidas possíveis de uma empresa ou empresários em crise econômico-financeira, destacam-se as de natureza tributária, que representam, muitas vezes, uma parcela significativa do passivo. A Lei n° 11.101/2005, contudo, prevê que os créditos tributários não se sujeitam à recuperação judicial, devendo ser exigidos nos termos da legislação própria. Isso significa que, mesmo com o ajuizamento da recuperação judicial, o devedor deve continuar a cumprir suas obrigações tributárias correntes e a pagar os tributos vencidos, sob pena de sofrer as sanções previstas na legislação, como multas, juros, inscrição em dívida ativa, protesto, execução fiscal, penhora de bens, entre outras.

Não bastasse todas as adversidades inerentes ao pleito de uma Recuperação Judicial, o fato é que desde a publicação da Lei nº 14.112/2020, restou consolidado o entendimento acerca da necessidade de apresentação de Certidão de Regularidade Fiscal como requisito para a homologação do plano de Recuperação Judicial.

Isso porque, antes da publicação da Lei nº 14.112/2020, os Tribunais, seguindo o posicionamento do STJ (Superior Tribunal de Justiça), entendiam pela flexibilização da comprovação de regularidade fiscal pelas empresas em recuperação judicial, dada a ausência de legislação específica que regulasse o parcelamento tributário no contexto desse regime.

No entanto, com a reforma na Lei de Recuperação Judicial e Falência, introduziu-se uma mudança significativa, permitindo tanto a adesão a parcelamentos tributários específicos quanto à transação tributária, o que trouxe maior previsibilidade e segurança jurídica às empresas nesse processo.

Assim, a transação tributária, especificamente, surge como uma estratégia imprescindível para empresas em recuperação judicial.

No âmbito federal, a transação tributária oferece benefícios como descontos de até 100% sobre juros, multas e encargos limitados ao principal e a 70% do valor da dívida), parcelamento em até 145 meses, flexibilização nas regras de garantias e utilização de créditos de prejuízo fiscal e precatórios para amortização do saldo devedor.

Dados publicados pela PGFN demonstram que, de 2020 a 2023, essa já recuperou aos cofres públicos aproximadamente R$ 117,2 bilhões, sendo R$ 32,2 bilhões decorrentes de acordos de transação tributária. Além disso, os dados demonstram que a proporção do valor total arrecadado e o valor total recuperado pela PGFN por meio dos acordos de transação têm crescido significativamente, o que indica que um percentual cada vez mais relevante da recuperação dos créditos tributários pela PGFN é decorrente de transações tributárias.

No estado de São Paulo, além da transação individual, a 3ª fase do programa Acordo Paulista, vigente até 31 de janeiro de 2025, oferece condições especiais para renegociação de dívidas inscritas na Dívida Ativa, abrangendo débitos de ICMS de empresas em recuperação judicial.

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O programa oferece descontos de 100% nos juros, multas e honorários (limitados ao principal e a 70% do valor da dívida), parcelamento em até 145 vezes, sem entrada, utilização de créditos acumulados de ICMS e precatórios para abater até 75% do valor do débito já reduzido, entre outras possibilidades.

Dados do governo de São Paulo mostram resultados positivos do Acordo Paulista. No primeiro edital, por exemplo, foram negociados R$ 14,6 bilhões líquidos em dívidas de ICMS. Em três meses de programa, o montante previsto para arrecadação superou a meta inicial de R$ 700 milhões para todo o ano de 2024, alcançando a marca de R$ 2,3 bilhões.

Os dados trazidos acima demonstram o potencial transformador do instituto da transação tributária em geral, bem como o de programas de regularizações incentivadas, que oferecem um alívio financeiro significativo às empresas em crise e ajudam, sobretudo, empresas em recuperação judicial a superar suas dificuldades, além de aumentarem expressivamente a arrecadação fiscal dos entes.

A integração entre recuperação judicial e transação tributária pode ser determinante para salvar empresas em crise, preservar empregos e manter setores econômicos em funcionamento. Entretanto, para eficácia desses mecanismos, é fundamental que gestores empresariais adotem práticas de planejamento financeiro e transparência, enquanto o poder público deve oferecer condições diferenciadas e viáveis para regularização do passivo fiscal e perpetuidade dos negócios no país.

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