O TikTok abraça os sentimentos de uma galera que tem fé no algoritmo, foi educada para buscar a rapidez das informações visuais dos vídeos curtos e tem uma paciência de centavos para consultar link por link até descobrir o que quer saber. Atrair uma atenção tão fugidia é tarefa difícil, mas é essa missão que o Google parece estar confiando ao YouTube —isso enquanto a busca com inteligência artificial não deixa de ser um experimento e vira o novo normal.
O que rolou?

Durante o Think with Google, evento realizado nesta semana em São Paulo, o Google mostrou nesta semana sua nova visão da jornada de um consumidor na internet. Voltado ao mercado publicitário, o encontro ainda passará por México, Colômbia e Argentina, aonde vai adquirir cores locais.
Aqui no Brasil, passo inicial dessa caminhada, soubemos que:
- Uma pesquisa realizada por Google e BCG (Boston Consulting Group) detectou um novo comportamento que influencia as intenções de compra na internet. Se antes...
- ... O caminho passava linearmente por "awareness", consideração e, por fim, a compra, agora mudou. E...
- ... A jornada é baseada em quatro etapas, não sequenciais e que podem se sobrepor: o streaming, a busca online, o hábito de "escrolar" e a compra. Se eu contei bem...
- ... Três dessas etapas passam por produtos do Google, sendo o YouTube --ainda que com alguns concorrentes-- responsável por duas delas e o motor de busca reinando como fornecedor solitário da fase restante. Além disso...
- ... Não faltaram casos de sucesso de empresas que desenharam estratégias envolvendo ações para uma, duas ou três das novas etapas de comportamento e fizeram engajamento virar venda. Não chega a ser uma cutucada no TikTok, que captura a atenção como ninguém sem que haja notícia de que seja um canhão de vendas, mas é uma mensagem e tanto. Só que...
- ... Havia outras mensagens a serem compartilhadas, e elas diziam respeito à geração Z:
Muita gente pensava no passado que a busca não funcionaria para Gen Z. Existem outras formas de as pessoas buscarem, e a geração Z é a que hoje em dia faz mais buscas que qualquer outra faixa etária
Fábio Coelho, presidente do Google Brasil
- ... É a primeira vez que o Google responde de forma tão contundente sobre o ceticismo sobre seu apelo junto aos mais jovens. E não parou por aí...
- ... Coelho ainda mencionou características do YouTube que dão match com o gosto deles: boa parte dos espectadores da geração Z (85%) sentem forte conexão com os criadores e, ao navegar pelos Shorts, eles sentem menos "doomscrolling", aquela sensação de perda de tempo ao se perder no arrasta para cima, do que em outras plataformas. Ele não mencionou, mas podemos imaginar que a comparação é com o TikTok e o Reels, do Instagram.
Por que é importante?

O YouTube assume de vez uma nova posição na estratégia do Google. Não é de hoje que a plataforma é uma das pontas de lança no crescimento da receita da empresa. Nessa trajetória, ela desbancou a TV tradicional nos Estados Unidos, é o destino de quem quer ouvir podcasts e é mais vista em televisões do que em celulares em terras norte-americanas.
Mas agora terá de enfrentar um rival nativo digital, assim como os usuários que pretende atrair. Há pistas de como o cenário está:
- De acordo com a consultoria YPulse, 46% das pessoas com idades entre 18 e 24 anos começam a busca por informação no Google;
- Essa é a regra para 58% daqueles com idades entre 25 e 39 anos.
- Um quinto da geração Z começa pelo TikTok e 5% deles recorrem ao YouTube
- Já um levantamento da Adobe mostra que 64% daqueles com 15 a 30 anos, os centennials, escolhem o TikTok para procurar informações.
Nenhuma das pesquisas mostra que o Google está sendo esnobado. Até porque o motor de busca da empresa tem sido usado como nunca. Atingiu 5 trilhões de consultas em 2024. Os dados mostram, porém, que algo está mudando, um sentimento que o engenheiro Berthier Ribeiro-Neto definiu assim durante sua participação em Deu Tilt:
Não vemos que isso está tendo um impacto negativo nas buscas, mas, se essas pessoas estão tendo uma experiência que é muito visual, quando se tornarem adultas, vão querer aquela experiência na busca ou vão se conformar com o que o Google tem?
Berthier Ribeiro-Neto, diretor de engenharia do centro de tecnologia do Google no Brasil por 19 anos
Não é bem assim, mas está quase lá
Se o Google está há mais de duas décadas entre nós, o TikTok tem menos estrada no retrovisor e explodiu mesmo durante a pandemia. É pouco tempo para mexer o ponteiro dos negócios de uma empresa com domínio absurdo como o Google. Tanto é que dados internos da empresa no Brasil dão conta que 83% da Geração Z usam seus serviços em alguma etapa das compras (descobrir, navegar, obter ideias, pesquisar e comprar). A ameaça é para os dias que virão, comenta o consultor em marketing digital Air Filho.
Essa geração vai em breve ter um maior poder de compra, e o Google precisa, sim, evoluir a experiência. Hoje, todos os sites já são otimizados para SEO, mas as respostas não são as melhores para ela, acostumada a vídeos e a ver seus influenciadores
Air Filho
Ainda que os resultados da busca já mostrem vídeos, é improvável que o Google mude a lógica da ferramenta para emular o TikTok.
Não é simples. A máquina de buscas tem uma experiência, e as pessoas têm uma expectativa. Se mudar radicalmente o produto, transformá-lo em um TikTok, você vai frustrar um bilhão de pessoas
Berthier Ribeiro-Neto
Tudo o que discutimos até agora não considera, porém, os efeitos da inteligência artificial na busca, a aposta do Google para seu futuro. Ainda que não pareça ter um modelo de negócio bem definido, essa modalidade já é popular. O AI Overview é usado por 1 bilhão de pessoas e sua evolução, o AI Mode, já está no forno.
É por isso que, por enquanto, é o YouTube que o Google enxerga no fim do túnel.
O comportamento da Geração Z antecipa tendências de uso muito mais amplas. Eles adotam uma nova forma de buscar e consumir informação no mundo digital (...) O Google tem noção disso. Por isso, coloca ênfase no YouTube Shorts. Não há risco de desaparecer, mas, sim, de perder relevância, principalmente na área de descoberta. E isso é fundamental para SEO
Air Filho, consultor de marketing digital e fundador da DigiFlow
DEU TILT
Toda semana, Diogo Cortiz e Helton Simões Gomes conversam sobre as tecnologias que movimentam os humanos por trás das máquinas. O programa é publicado às terças-feiras no YouTube do UOL e nas plataformas de áudio. Assista ao episódio da semana completo.

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Opinião
Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
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