Habitação social marca onda de progresso da Barra Funda, em SP

há 4 meses 23

O progresso parece ser uma sina da Barra Funda. O conceito já figurava nos sambas de Geraldo Filme, compositor hoje homenageado com uma estátua nas proximidades do Memorial da América Latina.

Dizia o sambista: "Surgiu um viaduto, é progresso/ Eu não posso protestar/ Adeus, berço do samba/ Eu vou-me embora/ Vou sambar noutro lugar".

O viaduto era o Pacaembu, que agora dá acesso a uma área de verticalização furiosa, em nova onda de progresso do distrito, em torno da avenida Marquês de São Vicente, eixo de transporte que a Lei de Zoneamento e a Operação Urbana Água Branca franquearam para diversos projetos de HIS (Habitação de Interesse Social).

Foi pensando no público de poder aquisitivo limitado que a Cury Construtora lançou três produtos: o The Place e o Mérito Barra Funda, ambos na av. Thomas Edison, e o Flow, na av. Antártica, bem no final do viaduto Pacaembu.

Só o The Place tem 985 apartamentos, distribuídos por dois edifícios de 22 andares e um terceiro de 21. Leonardo Mesquita, vice-presidente de Negócios da Cury, vê o bairro como um dos mais bem estruturados da cidade para a habitação social. Não apenas é bem servido de ônibus, com uma via segregada na Marquês de São Vicente, como tem em seus domínios a estação intermodal Barra Funda e a futura estação Santa Marina da linha 6-laranja do metrô.

"Com as pessoas morando ali, elas deixam de perder até duas horas diárias em deslocamentos", calcula, atribuindo aos novos moradores da região origens mais longínquas.

Mesquita ainda vê espaço para novos lançamentos populares na região, mesmo com a vizinhança do Jardim das Perdizes, conjunto de edifícios para moradores (bem) mais privilegiados, e com a valorização que deve resultar da chegada da linha laranja.


Este ano tem sido agitado na Barra Funda. De janeiro a junho houve, segundo a startup imobiliária Loft, aumento de 36,6% de vendas de apartamentos na região em comparação com o mesmo período de 2023; a valorização atingiu 8%. "A Barra Funda está num momento claro de valorização. Houve aumento de vendas de todos os tamanhos de imóveis, especialmente os menores", diz o gerente de dados da Loft, Fábio Takahashi.

Mirando um comprador de maior renda, a Kallas também tem projetos na região, mas um pouco mais ao sul, nas cercanias do parque da Água Branca e do shopping West Plaza. Dois deles levam o nome Perdizes, numa estratégia, bastante usual do mercado imobiliário, de tentar agregar valor com nomes dos bairros afluentes vizinhos.

O Origo Perdizes tem apês de dois dormitórios de 41 m² a 49 m². O valor do metro quadrado das 19 de 200 unidades que ainda restam está em R$ 14,6 mil; já o Domum Perdizes, com três quartos e
111 m², está 94% vendido. O metro quadrado dos quatro apartamentos ainda por comercializar vale R$ 14,3 mil.

Mas é mesmo no eixo da Marquês de São Vicente que o distrito mais se transforma, ou progride, como diria Geraldo Filme. A Plano&Plano, construtora focada em projetos populares, tem na avenida o MAPP, com 1.322 unidades a partir de R$ 211 mil.

Já deixando o distrito, perto da ponte da Casa Verde, o Portal Barra Funda é ainda mais portentoso, com 1.800 unidades distribuídas em cinco torres, quatro delas entregues, com preços desde R$ 259,9 mil. Outro Portal vem por aí, o Pacaembu, com 1.663 apartamentos desde R$ 227.927.

Renée Silveira, diretora de incorporação da Plano & Plano, faz coro com o colega Mesquita, da Cury, e vê na localização central e na facilidade de transporte os principais predicados da Barra Funda. Para ela restam ainda grandes terrenos com potencial habitacional, áreas que outrora abrigavam entrepostos que surgiram no entorno da histórica ferrovia Santos-Jundiaí.

São conhecidos os equipamentos culturais e de lazer da região: há o Sesc Pompeia, o Allianz Parque e o shopping Bourbon, no limite oeste; o Memorial da América Latina e o parque da Água Branca, no contorno sul.

O que fica fora dos limites do distrito é o próprio coração da Barra Funda, a região cantada não apenas pelo samba paulista, mas pelo melhor do nosso modernismo. O escritor Mário de Andrade morou em casa da rua Lopes Chaves —o imóvel abriga há décadas um museu que celebra a memória do ilustre morador. Pois bem: Mário pediu em "Quando Eu Morrer" que naquela mesma Lopes Chaves sua cabeça "esquecessem".

Não rolou, e provavelmente não foi por essa desfeita que a Barra Funda passou a enlouquecer quem ainda sonhava com a vida pacata dos tempos de Mário e Geraldo. Alguns quarteirões do bairro, especialmente nas ruas Sousa Lima e Vitorino Carmilo, viraram points noturnos, chegando mesmo a rivalizar com o miolinho de Santa Cecília na modalidade longevidade boêmia.

Se você tem saudade daquele chope servido em horário impublicável, não importando se o dia a nascer lá fora é terça-feira, quinta ou sábado, algo que nos anos 2000 era prerrogativa de alguns pouquíssimos bares da região da Vila Madalena, já sabe agora para onde rumar.

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