O governo também ampliou as renúncias previstas com na arrecadação da Previdência Social, em razão da desoneração das folhas de pagamentos dos municípios; houve uma redução de R$ 5,2 bilhões
Wilton Junior/ Estadão Conteúdo
Fernando Haddad durante anúncio congelamento de despesas de R$ 15 bilhões do Orçamento 2024 na última quinta-feira (18)
Depois de anunciar um congelamento de despesas de R$ 15 bilhões, na última semana, o governo federal piorou, nesta segunda-feira (22), a projeção de déficit para 2024. Agora, a estimativa é de que as contas públicas vão fechar no vermelho em R$ 28,8 bilhões – no piso da banda (intervalo de tolerância), já que o centro da meta é déficit zero. Isso porque a meta tem uma margem de tolerância de 0,25% do PIB, para cima e para baixo. O déficit de R$ 28,8 bilhões, portanto, é o limite inferior para o cumprimento da meta. No segundo bimestre, a previsão era de um bloqueio menor, de R$ 14,5 bilhões. As despesas primárias foram revistas para cima em R$ 20,7 bilhões, enquanto as receitas foram cortadas em R$ 6,4 bilhões. Sem o contingenciamento da última semana, de R$ 3,8 bilhões (também houve bloqueios de R$ 11,2 bilhões), o déficit estimado seria de R$ 32,6 bilhões – o que levaria a um descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Com o corte, contudo, a equipe econômica mirou o piso da banda permitido pela legislação. Pelo lado das despesas, os gastos obrigatórios foram revistos para cima em R$ 29 bilhões, enquanto as discricionárias (não obrigatórias, como custeio e investimentos) foram revistas para baixo em R$ 8,3 bilhões. A principal mudança aconteceu com o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que saltou 6,4 bilhões. Logo em seguida, vieram as despesas com a Previdência, com mais R$ 5,3 bilhões. “O bloqueio realizado nas despesas discricionárias, de R$ 8,3 bilhões, ocorre em função do aumento dos gastos obrigatórios”, afirmou o secretário-adjunto da Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Clayton Luiz Montes.
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Também houve aumento na projeção de despesas de R$ 1 bilhão com pessoal e encargos sociais, R$ 800 milhões em complementação do Fundeb e R$ 100 milhões com o programa Proagro. Em créditos extraordinários, houve aumento de R$ 14,2 bilhões, em virtude das medidas de socorro ao Rio Grande do Sul. Essa despesa, contudo, não é contabilizada no cumprimento da meta. Na visão da equipe econômica, contudo, os gastos continuam controlados, em 19,4% do PIB – pouco acima da média de 19,2% do PIB, entre 2015 e 2023, excluindo o ano de 2020, da pandemia. “Quando a gente olha a evolução das despesas primárias, no valor total, ao longo dos anos, na série histórica, vemos que ela se mantém sob controle, no patamar de 19,4% do PIB. A média é de 19,2% do PIB”, disse Montes.
Desoneração da folha
O governo também ampliou as renúncias previstas com na arrecadação da Previdência Social, em razão da desoneração das folhas de pagamentos dos municípios – houve uma redução de R$ 5,2 bilhões. Após um embate com o Legislativo contra a medida, o governo recorreu ao STF e obteve uma liminar suspendendo os efeitos da desoneração. Paralelamente, porém, a equipe econômica abriu uma negociação com senadores para a votação de um projeto de lei que contemple uma fonte de financiamento para a política pública, que atende também setores econômicos intensivos em mão de obra. Juntos, eles incluem milhares de empresas que empregam 9 milhões de pessoas.
O projeto de lei tinha previsão para ir à votação antes do recesso parlamentar, mas não houve acordo entre os senadores e a equipe econômica sobre as medidas de compensação. Pouco antes do recesso, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pediu para estender o prazo para se chegar a um acordo. A nova data é dia 11 de setembro. Entre as medidas apresentadas pelo Senado estão a repatriação de valores investidos por brasileiros no exterior e uma espécie de refis para dívidas de empresas com agências reguladoras. O Ministério da Fazenda tem sustentado que as ações são insuficientes para cobrir toda a despesa com a desoneração, inicialmente estimada em pouco mais de R$ 26 bilhões neste ano. O Senado tem uma projeção menor de renúncias, ao redor de R$ 17 bilhões.
Receitas
Entre as receitas, houve redução no previsto com julgamentos de grandes causas no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), estimado em R$ 55,6 bilhões neste ano, mas que caíram para R$ 37,7 bilhões, entre julho a dezembro deste ano. Nos meses anteriores, não houve entrada de recursos, segundo o Secretário de Receita Federal, Robinson Barreirinhas.
“A previsão inicial era ter entrada de recursos a partir de maio, porque os julgamentos estavam paralisados. Mas não houve entrada em maio e junho. Fomos aprofundar as razões, e houve um descolamento (no tempo) da previsão”, disse Barreirinhas. Nas concessões, o governo reduziu em apenas R$ 900 milhões a estimativa de receitas neste ano, mantendo a projeção para o ano em R$ 24,3 bilhões. Analistas têm apontado que esse número é de difícil realização, uma vez que arrecadação prevista com concessões no setor ferroviário, por exemplo, ainda não saíram do papel.
Ainda que a projeção anunciada tenha levado o déficit ao limite da meta estabelecida para este ano, o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, disse que não há no radar da equipe econômica mudar o objetivo. “Nesse (relatório) bimestral, sinalizamos que estamos muito próximos e temos condições de atingir a meta, não há necessidade de alteração (da meta)”, afirmou Ceron.
Segundo ele, as discussões sobre a fonte de recursos para compensar a política de desoneração da folha podem melhorar o cenário. “É crível o cumprimento da meta neste exercício, o que era impensável pelos agentes do mercado no início do ano”, disse o secretário. Neste momento, diz ele, a discussão é sobre quanto falta para o governo cumprir a meta. Diante das revisões para baixo do resultado fiscal, já se consolidou a percepção de que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está perseguindo o que se convencionou chamar de “centro” da meta fiscal, que prevê déficit zero neste ano.
No final de maio, a Consultoria de Orçamento, Fiscalização e Controle (Conorf) do Senado Federal apontou que, na prática, o limite inferior da meta passou a ser o alvo efetivo, o que seria “preocupante” e uma “interpretação menos cautelosa da lei”. Nesta segunda-feira, porém, o secretário de Orçamento Federal substituto, Clayton Montes, afirmou que “o centro da meta está sendo buscado, continua sendo buscado e vai ser buscado, sim”.
Emendas parlamentares
O governo ainda não fechou quais as áreas serão afetadas pelo contingenciamento e pelo bloqueio de despesas. Montes afirmou que as emendas parlamentares, tanto as individuais e coletivas de execução obrigatória, quanto as de comissão, de execução voluntária, podem ser alvo da contenção de despesas. No relatório anterior, o governo estabeleceu que nem as emendas nem as áreas de educação e saúde seriam afetadas pelo bloqueio na ocasião. Agora, não foi feita nenhuma restrição – o que pode indicar que essas áreas poderão ser atingidas.
Montes sublinhou que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano determina que as emendas só podem ser contingenciadas até o limite do contingenciamento das demais despesas do Executivo.
O secretário afirmou que o bloqueio de despesas não pode alcançar emendas parlamentares, uma vez que seria necessário cancelar despesas para cobrir gastos obrigatórios. Segundo ele, para fazer isso, seria necessário haver uma autorização expressa na lei de diretrizes orçamentárias e não há essa previsão neste momento.
Diferença entre bloqueio e contingenciamento
No contingenciamento, o governo congela despesas quando há frustração de receitas, a fim de cumprir a meta fiscal (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida). Para este ano e para 2025, a meta é de zerar o déficit das contas públicas.
Como a meta tem uma banda (intervalo de tolerância) de 0,25 ponto porcentual do PIB para cima e para baixo, o governo cumpre a meta desde que não extrapole o piso da banda – ou seja, um déficit de R$ 28,8 bilhões. Já o bloqueio é realizado para cumprir o limite de despesas do arcabouço fiscal. Assim, quando há aumento de gastos obrigatórios (como aposentarias, por exemplo), o governo bloqueia despesas não obrigatórias (como custeio e investimentos) para compensar.
*Com informações do Estadão Conteúdo
Publicado por Carolina Ferreira