"Meus chefes diziam para ter paciência, que com o tempo o reconhecimento viria, mas olhava para os colegas ao lado e todos tinham planos para melhorar a equipe e não eram ouvidos", conta Mateus Alves, 26, que trabalhava em uma empresa de tecnologia.
A conquista do emprego formal até que foi rápida para ele: começou como estagiário e já tinha sido contratado antes do fim da faculdade, mas as promessas adiadas de promoção acabaram desanimando o catarinense, que sempre ouviu ter perfil para ocupar um cargo de comando. Ele deixou a empresa após cinco anos e hoje é autônomo.
Assim como Alves, os trabalhadores jovens estão levando mais tempo para alcançar cargos de comando nas empresas, de acordo com um levantamento exclusivo feito pela consultoria Kairós Desenvolvimento Social.
Em 2008, os jovens da geração millennial ocupavam 7,67% dos cargos de dirigentes no mercado de trabalho formal. Agora, com a geração Z, esse percentual caiu pela metade: 3,89% em 2022.
Quando observados os cargos de dirigentes, houve queda também no número absoluto: de 4,65 mil, em 2008, e 6,81 mil, em 2009, para 3,88 mil, em 2022, segundo os últimos dados disponíveis da Rais (Relação Anual de Informações Sociais), do Ministério do Trabalho e Emprego.
Ao mesmo tempo, o total de cargos dirigentes subiu de 60,6 mil para quase 100 mil, o que fez a participação percentual da geração Z em posições de comando cair praticamente pela metade.
Para comparar os dois grupos, o levantamento considerou o recorte de 16 a 27 anos. Neste caso, a geração millennial abarca os nascidos entre 1981 e 1995 e a Z é a geração seguinte, a dos que nasceram até 2010.
A demora para conquistar um espaço no mercado formal vai além dos cargos de chefia. Em dezembro de 2022, a geração Z ocupava 25,1% das vagas formais no Brasil em regime CLT. Já a geração millennial, com a mesma idade (até 27 anos, em 2008), ocupava 33,8% das vagas.
Elvis Cesar Bonassa, diretor da Kairós, alerta que há uma ambiguidade no comportamento das gerações no mercado de trabalho: mesmo ocupando espaço menor, os jovens empregados em 2022 representavam 30% da geração Z.
Já aqueles jovens empregados em 2008 representavam um percentual menor, 26% da geração millennial. "Ou seja, a geração Z consegue proporcionalmente mais empregos e, no entanto, ocupa uma parte bem menor do mercado de trabalho."
Isso ocorreu, pois, em números absolutos, o total de jovens com trabalho formal subiu 3,8%, de 10,6 milhões, em 2008, para 11,04 milhões, em 2022.
O mercado de trabalho teve um crescimento nesse período, de 31,4 milhões para quase 44 milhões de postos de emprego formal, fazendo cair a participação proporcional dos jovens.
O envelhecimento da força de trabalho ajuda a explicar a demora para que os mais jovens ocupem cargos de comando nas empresas.
"Parece haver um menor ímpeto de envolvimento dessa geração com o trabalho formal e colocar como meta pessoal alcançar um posto de comando, como gerações anteriores pareciam ter. Também há pessoas mais velhas ocupando os cargos de chefia por mais tempo, a distância temporal não foi suficiente para uma troca de geração", diz ele.
Segundo Bonassa, como a geração Z parece valorizar mais a qualidade de vida do que a fidelidade ao emprego e a ascensão profissional rápida a qualquer custo, isso se reflete em sua trajetória no mercado.
"As formas virtuais de trabalho dão uma sensação maior de liberdade e poucos jovens parecem dispostos a ficar 12 horas por dia em uma empresa tradicional."
A diferença entre gerações no ambiente de trabalho é algo que motiva João Prandini, 26. "Mesmo nas startups em que eu trabalhei, não era um ambiente tão novo assim. Os chefes já eram pessoas formadas em suas áreas, que trabalharam para grandes empresas e queriam começar seus próprios projetos."
Tendo grande parte de sua experiência de trabalho durante a pandemia, ele conta ter se acostumado ao trabalho remoto ou, pelo menos híbrido, e que essa flexibilidade acaba pesando na escolha de uma vaga. O designer mora em São Paulo e hoje trabalha para uma empresa com sede nos Estados Unidos.
"Já tentei um emprego que era distante de onde moro e acho que isso pesou na hora de não me contratarem. Queria começar a trabalhar logo, em qualquer modalidade de emprego, e hoje continuo sem ser CLT, mas isso também varia. Um amigo entrou na mesma época em uma empresa grande e trabalha até hoje lá, em um modelo mais convencional", conta.
ENTRADA NO MERCADO FORMAL É DIVISOR PARA JOVENS DA PERIFERIA
Em abril, uma reportagem da revista Economist apontava que, nos países ricos, a geração Z, diferentemente de seus pais e irmãos mais velhos, aproveitava a taxa de desemprego menor e a média mais alta de remuneração para trocar de trabalho com mais frequência ou até mesmo adiar a busca por trabalho.
Mas essa não é a realidade para milhões de jovens brasileiros, que ainda têm na conquista de uma vaga formal uma oportunidade real de transformação.
Mariana Jardim, 21, é um exemplo disso. Moradora do Grajaú, na zona sul de São Paulo, ela entrou no mercado de trabalho como jovem aprendiz, em uma concessionária de veículos.
"Essa experiência fez total diferença na minha vida profissional, me senti acolhida antes mesmo de começar a trabalhar. Passei por um treinamento intensivo, aprendi a como me comportar em um ambiente corporativo, noções de informática, a cumprir prazos de entregas. Foi muito importante."
Um estudo realizado pela organização Juventudes Potentes, iniciativa da United Way Brasil, aponta que 60,4% dos jovens de 15 a 24 anos, da periferia de São Paulo, grande parte deles em situação de vulnerabilidade social, têm interesse em atuar no programa.
Apesar do interesse, apenas 1,5% conseguem uma oportunidade desse tipo e só 5,1% já trabalharam a partir dessa modalidade de contratação.
O estudo ouviu 600 jovens entre 15 e 29 anos dos extremos das regiões sul e leste da cidade. De acordo com os pesquisadores, grande parte dessa diferença se dá por conta da falta de informação e de conhecimento sobre os programas nas empresas.
Terminando a graduação em economia e depois de ter sido novamente aprendiz e estagiária, desta vez no mercado financeiro, Jardim conseguiu ser efetivada em um banco. Hoje, também atua em uma ONG voltada para a educação de jovens da região, onde divulga o programa de aprendizagem.
"Essas oportunidades não estão chegando e é fundamental que as empresas atuem para otimizar essa modalidade de contratação nas corporações. É preciso compromisso para fortalecer esse programa", diz Nayara Bazzoli, gerente geral do Juventudes Potentes.