Filme 'De Pai para Filho' se aproxima da mediocridade ao tentar agradar ao público

há 4 meses 24

Em "De Pai para Filho", segundo longa de ficção dirigido por Paulo Halm, Marco Ricca é Machado, o roqueiro que morre num acidente banal após uma tentativa abortada de suicídio, deixando seu apartamento e algum dinheiro para o filho do qual havia se afastado em vida.

Esse filho, José, é interpretado por Juan Paiva, o Buchecha de "Nosso Sonho". Ele pretende vender o apartamento, portanto, precisa esvaziá-lo. Conhece no elevador a vizinha Dina, vivida por Miá Mello, que nunca se recuperou emocionalmente da morte do marido. Dois perdidos nas questões do coração e do luto.

Machado volta ao apartamento como um fantasma. Toca Chopin ao piano. José, ao ouvir a bela melodia, rebate que é absurdo trocar uma carreira erudita por uma "bandinha de rock de quinta". O desprezo com que José diz isso é indicativo de que ele herdou pouco do pai.

Estão em lados opostos. O certinho é o filho, que despreza as coisas do pai, veste camisa social e usa óculos; o rebelde é o roqueiro de uma banda dos anos 1980 chamada Capa Preta, que fazia questão de não agir como a sociedade pedia.

Conforme José se atrasa para esvaziar o apartamento, se é que ele quer mesmo esvaziá-lo, aproxima-se de Dina e de Kat, filha adolescente de Dina, que estudava piano com Machado.

Temos uma comédia com toques de romance. Não bem uma comédia romântica, embora pareça ter esse subgênero como um norte. Tem ainda algo de um drama de acerto de contas com o passado, como o recente "Estranho Caminho", de Guto Parente.

O humor não funciona muito bem no filme, talvez por haver um aspecto de polidez excessiva por todos os lados, o que contamina um pouco o aspecto humorístico. Exemplo disso é quando um casal homossexual visita o apartamento e o retrato deles é bem caricatural.

Mas quando os dois homens flagram Dina e José aos beijos, um deles diz que vê ali um belo casal, que poderia até rolar sexo a quatro. É pelo jeito que ele fala, pelo tempo da cena e pelo horror na cara de José que o humor se faz.

Antes disso, Dina e Kat estão no elevador quando José entra com uma caixa cheia de discos para doação. Kat se empolga com os discos, mas José diz que gosta mesmo é de sertanejo. Ao ouvir isso, Dina diz "ninguém merece". Ao perceber o climão, emenda: "Ninguém merece este elevador".

Contando assim parece meio besta, mas a graça está na maneira como a atriz pronuncia as palavras, em seu rosto encabulado, na reação da filha e de José.

Fora isso, há piadas tolas para agradar a bolha progressista —uma zoeira com a dondoca que se perde quando está fora da Barra da Tijuca; um homem no aplicativo de paquera que tinha jeito de "bolsominion".

Há ainda um momento inspirado, quando após José mostrar que sabe dançar valsa ao som de Strauss, ele e Dina começam a fazer uma dança de sedução no silêncio. É uma cena inesperada, que rompe o tom mais convencional da sequência.

Uma pena que algumas coisas não se encaixem bem. É mal explicada, por exemplo, a postura de Dina com o marido, contada num flashback desnecessário. Algumas atitudes de José também não condizem com o que entendemos do personagem. E as soluções para os dramas apresentados são forçadas demais.

Para piorar, a direção do elenco é desigual. Marco Ricca segura bem algumas cenas, com sua experiência e talento. Mas no começo sofre com o estilo meio publicitário do filme. Miá Mello tem uma boa variação entre o drama e a comédia, mas por vezes exagera nas caretas. A pequena Valentina Vieira, que interpreta Kat, tem uma atuação digna.

Juan Paiva tem o papel mais difícil, e nem sempre segura a onda. A maneira afetada com que pronuncia "bandinha de rock" parece ultrapassar o tom da caricatura. Quando o personagem se solta, o ator parece ficar mais à vontade dentro do papel.

É um filme todo na corda bamba, num registro cheio de concessões para agradar a um público grande. E quanto mais faz concessões, mais se aproxima da mediocridade.

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