"Você não vai acreditar, faz 10 dias que não te vemos. Para atingir os resultados dos seus treinos é preciso persistir."
Abri esse email no meio de dezembro incrédula. É claro, rede de academias, que há dez dias não me via. Estive com cólica, em meio a episódios de ansiedade e letargia. O sono desregulado. Sem apetite. Preciso dizer que fiquei sem energia? Algo acontece no espectro depressivo pelo qual transito neste ano que se acaba. Mas além disso se impõem os prazos, os textos, a casa, o cuidado com aqueles pela qual sou responsável. A vida.
Escrever sobre o impacto que um email pode ter parece até mentira, às vezes. É parte do marketing de qualquer empresa, está "tudo certo" (tento me convencer, pensando que para alguém sem transtorno esse email pode ser outra coisa). Mas para quem lida com um transtorno alimentar, a cobrança para atingir os objetivos de um treino é como um lembrete do fracasso.
Afinal, há dez dias não piso na esteira. E o que é fracasso maior do que não correr atrás do corpo perfeito? Sou uma mulher jovem. Preciso desse corpo. Já estou atrasada. Isso é o que diz parte dos meus pensamentos.
Mas como preciso afastá-los, gasto muito tempo analisando quais tipos de investimento no meu bem-estar farei. Às vezes horas, o que me paralisa. Acaba o dia e eu não fiz nada além de considerar.
Como já contei aqui, quando me sinto muito mal com minha imagem, evito ações compensatórias. É que comer e purgar, comer e restringir, comer e fazer exercícios à exaustão, são sintomas do meu transtorno alimentar. Então passei dez dias lendo, para emprestar ideias de outros personagens. Brincando com os cachorros, para encontrar risadas sinceras dentro de mim. Estudando, para garantir o lembrete de que meu cérebro pode me levar a outros lugares. Dez dias, enfim, desviando o pensamento daquilo que me aprisiona.
Em alguns momentos fui capturada pelo desejo de contar calorias, evitar alimentos, me comprometer a correr 40 minutos por dia até o fim deste mês (vale dizer que eu nem corro). "Ainda dá tempo de emagrecer", pensei todos os últimos dias desde o fim de outubro. Mas fui conscientemente me permitindo "fracassar" nesse objetivo e suas implicâncias absurdas, optando por lidar, então, com a ideia de ser uma tragédia de décadas.
Fiz outras coisas, mas coloquei o movimento em segundo plano. Me alonguei, caminhei, passeei com os cachorros. Mas não tem novidade: vou ter que pisar em 2025 sem o "corpo do verão". Para isso foi preciso não me exercitar sob influência dos ímpetos compensatórios, resistir às dietas malucas que o Instagram me ofereceu de bandeja, como quem não quer nada, e também comer os chocolates que meu corpo pediu durante a TPM. Porque não seriam eles os culpados de algum ganho de peso significativo.
Não seria sair deste ano com menos peso que me livraria das ideias de que eu ocupo tanto espaço e ainda assim, sou tão pequena no mundo.
Veja quantas obviedades. Mas, afinal, você não vai acreditar, há décadas tento me convencer. Para atingir o resultado, é preciso persistir.
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