Exposição mostra Brasília entre o poder da política e a voracidade do sexo

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Brasília exala poder e desejo. A capital imaginada pelo artista plástico Evandro Prado é uma Sodoma e Gomorra tropical, onde o jogo da política se confunde com a voracidade do sexo.

"Existe uma relação muito grande entre sexo e poder. Além disso, no senso comum, política acabou virando o lugar da sacanagem", diz o artista, que ganha uma exposição neste sábado (10) na Zipper Galeria, em São Paulo.

A mostra traz um conjunto de 16 obras que fazem um retrato sarcástico e lascivo de Brasília. Nos trabalhos, vemos placas de motéis com referências a fatos políticos e históricos.

O "Pau Brasil Motel", por exemplo, aparece escrito em um cartaz de formato fálico com o Congresso Nacional ao fundo. Já o cartaz do "Motel Imbrochável" traz um letreiro onde lê-se: "O que é golden shower?". O trabalho faz alusão a dois acontecimentos folclóricos da política brasileira.

Em 2022, o ex-presidente Bolsonaro se disse "imbrochável" durante um ato no Sete de Setembro.

Já no Carnaval de 2019, o político compartilhou nas redes sociais o vídeo de um homem dançando sobre um ponto de táxi após introduzir o dedo no próprio ânus. Na sequência, surge outro rapaz que urina na cabeça do que dançava.

"É isto que tem virado muitos blocos de rua no carnaval brasileiro", escreveu Bolsonaro, fazendo a hashtag "goldenshowerbolsonaro" se tornar o assunto mais comentado do X, antigo Twitter. Após a repercussão, ele fez outra postagem, desta vez trazendo uma pergunta. "O que é golden shower?"

"Eu fui buscando esses nomes que remetem o tempo inteiro a questões políticas. No começo, pensei que conseguiria reunir no máximo cinco, mas acabou tendo mais", diz Prado. "O discurso do Bolsonaro é muito sexual."

O político também é conhecido por metáforas que fazem alusão a relações amorosas. Em 2020, após uma crise com Rodrigo Maia, então presidente da Câmara, Bolsonaro disse que a situação estava pacificada e que eles tinham voltado a namorar.

Prado diz que sempre se interessou pelo noticiário político, mas que a decisão de incluir esse tema em seus trabalhos aconteceu em 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff.

"Daí meu trabalho ficou completamente tomado pela arquitetura de Brasília e pela política." Em 2018, por exemplo, ele fez uma série retratando a capital em ruínas.

"A arquitetura dela representa aquela vontade modernista de construir o futuro, algo que foi interrompido pelo golpe militar", diz o artista. "São prédios muito simbólicos e significativos para mim e para todo mundo. Brasília remete à política, história, corrupção e poder."

Para a série, ele usou como referência a pop art de Andy Warhol, artista que lançou mão de cores berrantes em suas obras para falar sobre a sociedade do consumo. Por esse motivo, predominam nas telas de Prado cores quentes, como o vermelho e o amarelo.

Ele se inspirou também nos trabalhos de Allan D'arcangelo, artista conhecido por desenhar rodovias desertas.

A exemplo das obras do americano, a série de Prado coloca o público diante de um mundo desolado. Na capital que ele imaginou, não há nada além de sexo, poder e solidão.

As pinturas foram feitas sobre telas de linho, material que impõe desafios. A margem para erros nessa superfície é menor por ser difícil apagar traços que não ficaram como o planejado. Além disso, ele é mais caro em comparação com telas tradicionais.

Apesar da dificuldade, Prado entendeu que fazia sentido usar o material por ser uma referência aos lençóis dos motéis. "E acho também que a cor desse linho remete à aridez de Brasília, às areias de um deserto."

Essa não é a primeira vez que ele aborda temas espinhosos por meio da arte. Em 2006, fez uma série sobre consumismo em que manipulava imagens sagradas.

No lugar do coração da Virgem Maria, ele desenhou uma lata de Coca-Cola. Já em seu leito de morte, o papa João Paulo 2º aparecia segurando uma garrafa do refrigerante. As obras foram expostas no Museu de Arte Contemporânea de Campo Grande, acendendo uma crise com os católicos da capital sul-mato-grossense.

"Não era uma crítica à igreja, mas sim ao capitalismo". O arcebispo dom Vitório Pavanello não entendeu desse jeito.

À época, o clérigo entrou com uma ação criminal contra o artista o acusando de vilipendiar publicamente imagens sagradas. A justiça não aceitou o processo.

Já no ano passado, Prado participou da exposição "O Grito", na Caixa Cultural de Brasília. A instituição, no entanto, decidiu cancelar a mostra após críticas de deputados do centrão, que ficaram insatisfeitos com uma das obras. À época, especialistas consideraram a decisão da estatal uma forma de censura.

Prado diz que admira artistas que estimulam reflexões. Por essa razão, decidiu apostar em trabalhos mais provocativos. "Tenho interesse por dessacralizar as coisas. Esse é o papel da arte."

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