O PL, partido de Jair Bolsonaro, conseguiu nesta semana assinaturas suficientes para protocolar um pedido de urgência para a análise do projeto de lei que anistia os participantes de atos golpistas. Até que vire realidade, porém, o texto tem um longo caminho pela frente.
Para isso, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), terá que pautar a votação da urgência pelo plenário. Depois, o conteúdo em si precisará ser discutido e aprovado pela maioria dos parlamentares presentes tanto na Câmara quanto no Senado, e então ser sancionado pelo presidente Lula (PT).
Entenda o projeto em debate, os próximos passos da sua tramitação, a pressão em torno de Motta e quem apoiou a urgência na análise:
O que diz o projeto de anistia?
O pedido de urgência apresentado se refere a um projeto de lei de 2022, do então deputado Major Vitor Hugo (PL-GO), que propõe anistia a todos que tenham participado de atos "do dia 30 de outubro de 2022 [data do segundo turno, incluindo protestos em rodovias e quartéis] ao dia de entrada em vigor" da lei.
Mas foram apensadas outras seis propostas ao texto, ampliando a discussão. Parte dos deputados defende usar como referência um parecer de 2024, do então relator Rodrigo Valadares (União Brasil-SE), que expandia a anistia a todos os atos passados e futuros ligados aos ataques às sedes dos três Poderes.
A pedido de Bolsonaro, o PL agora estuda uma nova versão mais branda do texto, que possivelmente restrinja o perdão aos condenados pelos atos de 8 de janeiro, para convencer Motta a pautar a urgência da proposta.
Como a Folha mostrou, deputados que assinaram o requerimento o fizeram "no escuro", ainda sem saber ao certo o teor da proposta. Há diferentes entendimentos, por exemplo, sobre quais crimes, qual período e quem exatamente o texto deve abarcar, incluindo o ex-presidente, que é réu no STF.
Quais são os próximos passos?
1. Pedido de urgência
O PL conseguiu reunir 262 assinaturas (eram necessárias 257) e apresentou na segunda (14) o requerimento de urgência do projeto na Câmara. A urgência permite que as matérias tramitem mais rápido, indo direto ao plenário, sem precisar passar pelas comissões da Casa, onde o andamento poderia se alongar.
2. Decisão de Motta
Agora, o presidente da Câmara precisa decidir se pauta ou não a votação do pedido de urgência pelo plenário. Ele já indicou que não decidirá sozinho e que pretende levar a discussão para o colégio de líderes, cuja próxima reunião deve ocorrer no dia 24 de abril, após os feriados de Páscoa e Tiradentes.
3. Votação da urgência
Para ser aprovado, o requerimento de urgência precisa ser acatado, novamente, por no mínimo 257 dos 513 deputados.
4. Debate na Câmara
Motta então indicará um relator para a proposta, que apresentará um novo texto ao plenário a partir das negociações na Casa —como mostrou a Folha, Rodrigo Valadares é cotado, mas não é o único nome. A aprovação exige a presença de ao menos 257 deputados e o apoio da maioria deles.
5. Debate no Senado
Se aprovado na Câmara, o projeto de lei seguirá para o plenário do Senado, onde também precisa ser aprovado pela maioria dos presentes, com quórum mínimo de 41 senadores. Se houver mudanças, posteriormente o plenário da Câmara analisará apenas as alterações, podendo mantê-las ou recuperar o texto original.
6. Análise do presidente
Lula então tem 15 dias úteis para sancionar ou vetar a lei, caso aprovada nas duas Casas. Se ele vetar o texto inteiro ou apenas alguns trechos, os vetos voltam para análise no Congresso que, em sessão conjunta, avalia se derruba ou mantém o entendimento do presidente.
7. Papel do STF
Depois de ser aprovada e entrar em vigor, a lei de anistia ainda pode ser questionada no Supremo Tribunal Federal, que avaliará se ela está de acordo com a Constituição ou não.
Motta deve pautar o pedido de urgência?
O presidente da Câmara está numa saia-justa entre o compromisso que firmou com o PL, de pautar a urgência caso o partido conseguisse as assinaturas necessárias, e com integrantes do governo e do Supremo, que avaliam que o projeto de anistia poderia abrir uma crise institucional.
Nesta terça (15), ele indicou que levará a proposta para discussão no colégio de líderes para diluir a responsabilidade. Até a última sexta (11), Motta negociava com Lula, lideranças políticas e ministros do STF uma alternativa ao projeto de anistia, ainda sem um formato definido.
Para frear a pressão bolsonarista, seus aliados também esperam que o Planalto intensifique sua atuação pela retirada de apoio de parlamentares da base governista à proposta —o governo já havia conseguido 20 desistências ao pedido de urgência quando o PL mudou de estratégia e antecipou a apresentação do requerimento.
Adversários de Bolsonaro lembram que não há obrigação de Motta dar seguimento imediato ao pedido de urgência assinado. Dizem que há outras 2.000 propostas com requerimentos de urgência apresentados na fila para tramitação.
Quem apoiou o pedido de urgência?
Mais da metade das 262 assinaturas de deputados para o pedido de urgência veio de partidos da base do governo Lula.
No grupo governista, os que mais demonstraram adesão foram o PP —a pedido do presidente do partido, o senador Ciro Nogueira— e o União Brasil, que negocia o deputado Pedro Lucas Fernandes (MA) como ministro das Comunicações.