Se a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar em 1 ponto percentual a taxa de juros Selic nesta quarta-feira, para 12,25%, não chegou a surpreender os economistas, o tom abertamente mais duro (“hawkish”, no jargão do mercado) do comunicado cumpriu esse papel. Ao contrário dos avisos anteriores, a diretoria do BC voltou a sinalizar a tendência futura e praticamente antecipou duas novas altas da mesma magnitude no início de 2025.
Para Roberto Padovani, economista-chefe do banco BV, o mais importante nessa reunião foi mesmo a comunicação, sinalizado a necessidade mais duas altas, “portanto um choque monetário de 3 pontos percentuais”, classifica.
Para ele, essa postura tem muito a ver com a leitura do cenário, que apresenta não apenas uma piora nas expectativas de inflação, mas também resistência da inflação corrente e preocupações com o risco inflacionário gerado pelo câmbio.
“Independentemente da causa dessa pressão cambial, se externa ou interna, o BC reage ao cenário adverso. Como a própria autoridade monetária sinalizou, existe muito mais certeza desse cenário adverso. Portanto, uma ação contundente, que procura reforçar o compromisso do BC com o sistema de metas”, avalia.
O economista-chefe da XP, Caio Megale, em entrevista na live do Infomoney no Youtube, classificou a reunião de hoje como histórica, não só pela decisão, como por ser a última sob o comando de Roberto Campos Neto, o primeiro presidente do BC autônomo.
Sobre a decisão, ele lembrou que todos os fundamentos econômicos estavam apontando para uma inflação bem mais alta pela frente, isso até antes da depreciação cambial recente.
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Megale acredita que o BC ainda deve aplicar uma dose de 0,75 p.p. em maio, após as duas altas de 100 pontos-base já contratadas, levando a Selic a 15%.
Para o economista, essa taxa é bem alta e não significa, necessariamente, que haverá um atraso no ajuste da taxa para baixo ainda em 2025, uma vez que a economia vai estar desacelerando no período e o ciclo deve ajudar a trazer o câmbio para um patamar mais estável.
“Estamos indo para juros ainda maiores e mais rápido. Talvez o ajuste venha mais rápido também”, explicou ao analisas a estratégia do BC de vir mais forte no começo, aplicando um choque para reequilibrar as coisas. Isso se houver uma percepção do governo de que um freio de arrumação é necessário.
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Na opinião de Leonardo Costa, economista do ASA, o comunicado reconhece a forte piora dos indicadores nas últimas semanas. Ele destaca ainda a piora nas projeções: o modelo do BC indica um IPCA de 4,0% no 2º trimestre de 2026, distante da meta de 3%.
Ele cita ainda o comentário de que houve redução de incertezas na conjuntura internacional, ainda que os próximos passos do Federal Reserve (Fed, o BC americano) sejam encarados como um desafio e requeiram cautela dos países emergentes.
“No ambiente doméstico, é notável o reconhecimento do ritmo mais forte da atividade, que impacta via aumento ainda maior do hiato do produto, já considerado positivo”, cita Costa, ao lembrar que o balanço de riscos segue desequilibrado, com persistência do risco para mais inflação.
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Para ele, o comunicado foi suscinto ao comentar o cenário fiscal, apenas observando que o anúncio do pacote afetou o preço dos ativos, as expectativas dos agentes, o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio, e que estes efeitos são deletérios para a dinâmica inflacionária.
Capacidade de reação
Já Daniel Cunha, estrategista-chefe BGC Liquidez, afirma que o BC mostrou humildade em reconhecer que estava atrasado e ficando atras da curva. “Mais importante, mostrou capacidade de reação e adaptação, recuperando as rédeas da condução da política monetária, ao subir 100 bps e retomar o ‘forward guidance’ de maneira a sinalizar mais altas neste ritmo a frente”.
O economista acredita que o mercado deverá reagir positivamente, com destaque para queda do dólar.
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Na avaliação de Luis Cezario, economista chefe da Asset 1, a decisão do Copom foi correta. “Embora o cerne do problema seja a política fiscal, é dever do BC implementar a política monetária necessária para buscar reestabelecer um ambiente de estabilidade de preços, mesmo que isso gere um custo mais elevado para a atividade econômica no curto prazo”, comenta.
Segundo o economista da Asset 1, em um ambiente desafiador como o atual, sinais de hesitação por parte do Banco Central poderiam acentuar o processo de desancoragem das expectativas de inflação e levar a um resultado pior a médio prazo, com mais inflação e juros terminal ainda mais elevado. “Ao sinalizar que agirá de forma firme para buscar o cumprimento da meta de inflação, o Copom contribuirá para reduzir o prêmio de risco de inflação na curva de juros.”
Para o economista André Perfeito, a sinalização do Copom sobre duas novas altas de 100 pontos-base implica dizer que a Selic vai pelo menos até 14,25%.
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“Cabe nos perguntar como vão descomprimir as altas. Minha impressão é que devem desacelerar as altas com uma alta de 50 pontos e, depois, uma final de 25 pontos. Dito isso chegamos a uma Selic de 15% no ano que vem.
Ele se mostra pessimista sobre a possibilidade de haver espaço para cortes no ano que vem e cita como um dos motivos as incertezas sobre o início da administração de Donald Trump, com o Fed precisando subir juros. Além disso, ele lembra que o regime climático não deve ser favorável o ano que vem.
“Dito isso, a variável de ajuste necessariamente será o dólar e, neste sentido, podemos ver alguma melhora do real. Afinal muito provavelmente seremos, mais uma vez, a maior taxa de juros real do planeta.”
Para Paulo Gala ,economista-chefe do Banco Master, a decisão e a comunicação foram “duríssimas”. “Eu imaginava 0,75 (p.p.) e veio muito mais do que eu imaginava. Não resta qualquer dúvida do compromisso desse Banco Central em controlar a inflação. Ninguém tinha na conta um choque tão violento de 3 altas de 1%. Os mais pessimistas com o tamanho do choque estavam com uma conta de 100 basis agora. “
“O comunicado também é bastante duro, não deixa qualquer dúvida sobre o que se passa. E o Copom está simplesmente lendo o que está acontecendo, a inflação de serviços muito resiliente, o hiato cada vez mais pressionado com a economia aquecida crescendo perto de 4%, a conjuntura lá fora tem problemática com o câmbio se desvalorizando, o real a R$ 6”, lista..
Segundo Gala, esse Copom foi muito importante porque é uma sinalização. “É o primeiro Copom depois do atraso do pacote fiscal, que não veio com a força que se imaginava. E depois, com o movimento do dólar indo a R$ 6. Então todo mundo queria saber como o Copom ia reagir a isso. Está dada a resposta aí, assim que o novo Copom vai reagir a tudo que está acontecendo”, afirma.
Para Danilo Igliori, economista-chefe da Nomad, diante de um contexto adverso, o Copom fez tudo o que podia para tentar convencer de que não [os diretores] pouparão esforços para trazer a inflação para meta.
“Decisão unânime de acelerar pra valer a subida de juros e teor do comunicado foram nessa direção. Mais importante, reativaram o ‘forward guidance’, sinalizando mais dois aumentos de 100 pontos base. O movimento de hoje deve contribuir para o processo de recuperação da credibilidade do colegiado e dar um alívio para os agentes do mercado financeiro”, avalia.