'Copom do Lula' conta com freio na economia para evitar mais altas de juros

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Gabriel Galípolo, o novo presidente do BC, foi indicado pelo presidente Lula
Gabriel Galípolo, o novo presidente do BC, foi indicado pelo presidente Lula Imagem: Sergio Lima/AFP

O tom do comunicado divulgado pelo Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central), com a indicação dos próximos passos da política de juros, foi considerado "brando" por economistas do mercado financeiro.

No documento, o colegiado que reúne a diretoria do Banco Central, já agora sob a presidência do economista Gabriel Galípolo, sinaliza nova alta de juros no Copom de março, na mesma magnitude de um ponto percentual definida na reunião desta quarta-feira (29), deixando em aberto o que virá daí em diante ao longo de 2025.

Reversão no segundo semestre?

Depois da divulgação do comunicado, as apostas dos economistas do mercado financeiro são de que o ciclo de alta dos juros deverá avançar até 15,75%. Isso significa que, além de alta da Selic para 14,25% em março, haveria espaço para uma elevação total de 1,5 ponto nas restantes seis reuniões do ano.

Apesar da menção explícita à "relevante" elevação das expectativas de inflação para 2025 e 2026, a interpretação do mercado é a de que o Copom, agora com sete de seus nove integrantes indicados pelo presidente Lula, mostrou preocupação com os "impactos sobre o cenário de inflação de uma eventual desaceleração da atividade econômica doméstica mais acentuada do que a projetada".

Numa tradução do "coponês" — o idioma cifrado e para iniciados dos comunicados do Copom —, o BC estaria indicando que, diante de uma situação de recuo mais forte da atividade, o ritmo de altas da Selic poderia ser moderado, inclusive com um encurtamento na duração do ciclo de elevações da taxa básica de juros.

O comunicado parece ter contribuído, juntamente com outras notícias, caso do resultado bem menos pior do que o previsto das contas públicas, para aliviar a pressão sobre os mercados de ativos, no restante da semana, pelo menos temporariamente. A cotação do dólar confirmou trajetória de recuo, a Bolsa registrou altas fortes e os juros futuros acalmaram.

Sinais de desaceleração

Está cada vez mais disseminada entre os analistas da economia a expectativa de que a atividade registre freada mais evidente, a partir do segundo semestre ou ainda em fins da primeira metade do ano.

Já não são poucos os que projetam recuos trimestrais do PIB (Produto Interno Bruto), no segundo semestre. A hipótese de que a economia entre na chamada "recessão técnica" — quando há recuo da atividade em dois trimestres consecutivos — entrou nos modelos de projeção.

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Até aqui, as previsões são de que a economia cresça em 2025 acima dos relativamente fortes 3,5% com que deve fechar 2024. Mas o avanço não passaria muito de 2%, numa visível redução de ritmo.

O carregamento estatístico da expansão de 2024 para este ano deve ser pequeno, caso se confirme o início de freada no último trimestre do ano passado, como alguns resultados apontam. Vai contribuir, de todo modo, juntamente com a esperada boa safra agrícola, para empurrar a economia a um resultado positivo, no primeiro semestre.

Um desses sinais de freada foi confirmado nesta quinta-feira (30), com a divulgação das estatísticas do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) de dezembro e do ano fechado de 2024. Ainda houve criação de vagas no ano, mas, a partir de outubro, os números passaram a esfriar.

Isso fez com que as projeções para o ano ficassem mais altas do que o resultado efetivo. Das 1,8 milhão de vagas previstas, o Caged registrou aumento de 1,7 milhão de vagas no ano.

Os dados da PNAD Contínua, pesquisa do IBGE que apura a situação do mercado de trabalho como um todo, divulgados nesta sexta-feira (31), confirmam o início de uma desaceleração do nível de ocupação, no fim do ano. A taxa de desemprego referente ao último trimestre de 2024, subiu ligeiramente para 6,2% da população ativa, acima das previsões de 6% da força de trabalho desocupada.

É normal que o número de vagas no mercado de trabalho formal recue em meses de dezembro, com a demissão do pessoal contratado para atender à demanda reforçada das festas de fim de ano. Mas o recuo no mês passado, com o fechamento de 530 mil postos de trabalho, superou as estimativas.

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Também há sinais de freada na atividade quando se observa a marcha dos pedidos de recuperação judicial de empresas. No acompanhamento da Serasa Experian, o volume de pedidos de recuperação superou 2 mil em 2024, com aumento de mais de 60% sobre 2023 , num recorde da série histórica iniciada em 2014.

Recorde de pedidos de recuperação em ano de bom crescimento da economia é sinal de que a alta dos juros já está derrubando empresas. Também pessoas que carregam dívidas — um exército que atinge quase metade da população adulta — está sendo obrigada a restringir consumo.

Ao considerar o comunicado "leve", economistas de mercado parecem não confiar na declaração do Copom, registrada no comunicado, de que "a magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta".

Centro da meta distante

A "firme" perseguição da meta de inflação pelo Copom é uma das impressões digitais já deixadas pelo novo presidente do BC no comunicado com sua primeira assinatura como presidente do BC. Desde sua indicação para a presidência do BC, Galípolo tem repetido que cabe ao BC cumprir o determinado pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), ou seja, perseguir o centro da meta, na execução da política monetária.

Esse compromisso exigiria uma de duas — ou as duas — ações concretas, nas atuais condições da economia. A primeira seria levar a Selic ao entorno de 20% nominais ao ano, enquanto a outra exigiria promover um ajuste fiscal à la Milei, na Argentina, numa reversão de uns quatro ou cinco pontos no déficit atual, para obter superávits primários acima de 3% do PIB. Não há espaço política para nenhuma nem outra.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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