Contratada da BYD nega acusação de condição análoga à escravidão na Bahia e fala em rótulo injusto

há 15 horas 1

O Jinjiang Group, contratada da fabricante chinesa de veículos elétricos BYD, disse nesta quinta-feira (26) que a descrição de autoridades brasileiras de que seus funcionários eram submetidos a "condições análogas à escravidão" na fábrica que está sendo construída em Camaçari (BA) é inconsistente com os fatos e que há mal-entendidos na tradução.

"Ser injustamente rotulado como 'escravizado' fez com que nossos funcionários sentissem que sua dignidade foi insultada e seus direitos humanos violados, ferindo seriamente a dignidade do povo chinês. Assinamos uma carta conjunta para expressar nossos verdadeiros sentimentos", disse o Jinjiang em sua conta oficial na rede social Weibo.

Na segunda-feira (23), uma força-tarefa de órgãos federais anunciou ter encontrado 163 chineses trabalhando em "condições análogas à escravidão" em um canteiro de obras de uma fábrica de propriedade da BYD na Bahia.

O resultado parcial das inspeções foi apresentado pelo Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego, Defensoria Pública da União, Polícia Rodoviária Federal, Ministério Público Federal e Polícia Federal.

A BYD disse que cortou relações com a empresa que contratou os funcionários e que estava trabalhando com as autoridades.

A declaração do grupo Jinjiang foi repostada por Li Yunfei, gerente geral de marca e relações públicas da BYD, em sua própria conta no Weibo. Ele acusou "forças estrangeiras" e alguns veículos de mídia chineses de "deliberadamente difamar marcas chinesas e o país e minar o relacionamento entre a China e o Brasil".

Um representante da BYD direcionou a Reuters para a postagem de Li no Weibo quando perguntado sobre os comentários do Jinjiang e a situação. O Jinjiang não respondeu a um pedido de comentário da Reuters.

O Jinjiang disse que houve problemas de tradução e diferenças culturais que levaram à situação, e que as perguntas dos auditores brasileiros foram "sugestivas". A companhia também publicou um vídeo mostrando um grupo de trabalhadores chineses em frente à câmera, com um deles lendo uma carta que, segundo o Jinjiang, os trabalhadores assinaram em conjunto.

A carta dizia, por exemplo, que 107 trabalhadores haviam entregado seus passaportes à empresa para obter ajuda na solicitação de um certificado de identidade temporário no Brasil. Os auditores brasileiros disseram que os trabalhadores tiveram seus passaportes retidos pela empresa.

No vídeo publicado pela Jinjiang, um homem chinês, que não é identificado mas seria um dos funcionários da empresa, diz estar muito feliz por trabalhar na Bahia e afirma que estão sendo cumpridas as leis e os regulamentos.

A BYD está construindo a fábrica com uma capacidade anual de produção de 150 mil carros inicialmente no Brasil, o maior mercado externo da gigante chinesa de veículos elétricos, como parte dos planos para iniciar a produção em 2024 ou no início de 2025.

O Brasil vai aumentar as tarifas sobre os veículos elétricos importados de 18% para 35% em julho de 2026.

Na quarta-feira, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China Mao Ning disse que a embaixada chinesa no Brasil estava se comunicando com as contrapartes brasileiras para verificar a situação e lidar com ela.

ENTENDA O CASO

Segundo a investigação, foi feito o resgate de 163 trabalhadores, todos chineses, que estavam trabalhando em condições degradantes, com jornadas extenuantes e restrições à liberdade. Todos os operários foram ouvidos individualmente, disseram os órgãos. Eles eram funcionários da empresa Jinjiang Group, uma das empreiteiras contratadas para realizar a obra, de acordo com a força-tarefa.

Também foi constatada superlotação nos alojamentos dos trabalhadores da empresa terceirizada Jinjang, que não tinham colchões, nem condições adequadas de higiene.

Os operários estavam distribuídos em cinco alojamentos em Camaçari. Em apenas um deles, destinado a trabalhadores administrativos, não houve resgate de trabalhadores.

Em um dos alojamentos, os operários dormiam em camas sem colchões e não tinham armários para seus pertences pessoais, que ficavam misturados com materiais de alimentação. Havia apenas um banheiro para cada 31 trabalhadores, o que os forçava a acordar às 4h para conseguir se preparar para sair para trabalho às 5h30, de acordo com os órgãos federais.

Além de insuficientes, segundo a investigação, os banheiros não eram separados por sexo e apresentavam condições precárias de higiene. Sem local apropriado para lavar roupas, os trabalhadores usavam próprios banheiros para esta finalidade.

Os operários também entraram no país de forma irregular, na avaliação dos auditores. Eles usavam vistos temporários de assistência técnica, voltados para trabalhadores especialistas. Ao menos 107 chineses tiveram seus passaportes retidos pela empresa e parte deles só podia sair dos alojamentos com autorização, segundo os auditores.

Reportagem da Agência Pública publicada em novembro revelou que trabalhadores chineses de empresas terceirizadas que atuam na construção da fábrica estariam sendo submetidos a rotinas de trabalho de até 12 horas por dia, sem folga semanal e sem equipamentos de proteção.

Folha Mercado

Receba no seu email o que de mais importante acontece na economia; aberta para não assinantes.

Uma audiência virtual conjunta do Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho foi marcada para quinta-feira (26), para que a BYD e a Jinjang apresentem as providências para garantir condições mínimas de trabalho e alojamento.

A investigação prosseguirá com análise de documentos e não está descartada a necessidade de novas inspeções nos alojamentos e canteiros de obras.

Com informações de João Pedro Pitombo

Leia o artigo completo