Atualmente, é comum investidores com elevados patrimônios dizerem que seus recursos estão em um Family office. Mas, o que é essa instituição e como ela se diferencia dos bancos? Para explicar isso, conversei com Bruno Poles, um experiente analista de investimentos que desde 2021 presta serviços de consultoria para family offices.
Com uma sólida carreira no mercado financeiro, incluindo passagens por renomadas gestoras, Bruno traz uma visão profunda sobre as particularidades desse modelo de gestão patrimonial. Bruno, que é bacharel em Administração pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e candidato ao CFA Level III, oferece insights valiosos sobre as diferenças entre family offices e bancos, destacando como os primeiros proporcionam uma plataforma aberta que vai além dos investimentos financeiros, incluindo aspectos como planejamento sucessório, governança familiar e assessoria jurídica.
Ele também aborda os custos e a viabilidade dos serviços, revelando que, no Brasil, family offices geralmente atendem famílias com patrimônio acima de R$ 100 milhões.
Ao longo da entrevista, Bruno discute as atividades e a estrutura de um family office, os tipos de investimento preferidos por essas entidades e os desafios comuns enfrentados, como sucessão e conflitos geracionais.
Sua expertise destaca a importância de uma gestão patrimonial bem estruturada para garantir a longevidade do capital familiar e a relevância crescente dos family offices no cenário financeiro global.
Prepare-se para uma leitura que não só esclarece a complexidade desses serviços, mas também instiga a curiosidade sobre como grandes fortunas são geridas de maneira estratégica e confidencial.
Family office versus investimentos em bancos: quais são as principais diferenças?
Family Office é um escritório/entidade que centraliza serviços para uma família com o intuito de preservação e perpetuidade de seu capital. Em um banco ou assessoria de investimentos, o cliente costuma receber oferta de produtos ligados ao banco/assessoria que o atende, e o foco tende a se concentrar no portfólio de investimentos. Já em um family office, é comum que o cliente esteja em uma "plataforma aberta" com diferentes custódias e relacionamentos bancários, tendo uma oferta de produtos que abrange não só investimentos, mas também vários outros temas não financeiros que envolvem o dia a dia da família. Multi-family office (MFO) é um escritório que serve a várias famílias, enquanto o single-family office (SFO) irá atender uma única família. São empresas que prezam pela discrição e confidencialidade. Segundo a Preqin, em 2023 havia pouco mais de 4500 family offices no mundo, número que triplicou desde 2019.
O que faz um family office e quais são suas principais atividades?
Os family offices têm natureza heterogênea, ou seja, cada organização tem uma estrutura com características únicas. De maneira geral, os serviços incluem gestão de investimentos, planejamento financeiro e tributário, concierge, planejamento sucessório, governança familiar, gestão de conflitos, controle de orçamento e despesas, assessoria jurídica, consolidação de ativos e aconselhamento educacional. Iniciativas de impacto, filantropia e ESG são temas que cada vez mais ganham relevância entre as famílias investidoras.
Quanto custa e a partir de qual montante vale a pena buscar os serviços de um family office?
Segundo o UBS Global Family Office Report 2024, o custo anual médio de operação de um single-family office está na faixa de 0,35% a 0,43% do montante sob gestão. Quanto maior a escala e o patrimônio, menor tende a ser o custo percentual. Entre as principais linhas de custo inclusas nestes percentuais estão: pessoal, compliance, infraestrutura física, tecnologia da informação e research. No Brasil, é comum encontrar MFOs que atendam famílias com patrimônio acima de R$ 10 milhões. No caso dos SFOs, as famílias geralmente possuem patrimônio mínimo de R$ 100 - 250 milhões.
Quem trabalha na estrutura de um family office?
Family offices possuem diferentes áreas especializadas para suas necessidades. Equipes de investimentos, fiscal, tributário, jurídico e administrativo são comuns. Há casos em que a família opera um negócio familiar através de uma holding e, portanto, possui uma estrutura organizacional semelhante à de uma empresa, com departamentos financeiro, recursos humanos, logística e operações, marketing e vendas, etc. É comum que a área de family office esteja separada da estrutura organizacional que gere o negócio familiar. Há family offices que contam com uma equipe externa e independente de diretores e conselheiros que ajudam em diretrizes estratégicas de investimentos e/ou negócios, situação semelhante à das grandes companhias que possuem conselheiros independentes.
No que investe um family office?
Dado o horizonte perpétuo/geracional/de longo prazo, os family offices conseguem aproveitar o prêmio de iliquidez e alocar parte relevante de seu patrimônio em investimentos alternativos, como private equity, venture capital e real estate. Esses investimentos podem ser feitos através de gestores e fundos ou em ativos diretos (os chamados co-investimentos/deals diretos). Muitas famílias optam pelos co-investimentos por poderem negociar taxas menores e para terem mais controle sobre os ativos investidos. Uma vantagem dos family offices é poder agregar cheques de diferentes indivíduos e famílias para alcançar os valores mínimos exigidos pelos gestores. No entanto, family offices também investem em classes de ativos tradicionais, como renda variável, renda fixa e crédito. Tudo depende do perfil de risco e objetivos da família, bem como da crença no desempenho futuro e papel de cada classe de ativo em um portfólio. Dado que cada investidor ou membro da família possui um mandato único, cabe à equipe de investimentos se relacionar com diversos stakeholders do mercado para poder apresentar as oportunidades de investimento adequadas.
Quais são os desafios comuns que um family office enfrenta?
Alguns dos desafios compartilhados entre family offices incluem sucessão, governança, educação financeira, adoção de sistemas de tecnologia da informação, conflitos geracionais, assuntos que se misturam entre a operação da holding versus investimentos, gestão de ativos ilíquidos, riscos cibernéticos, entre outros. A lista pode ser bastante extensa dada a peculiaridade de cada história e negócio familiar. Segundo a Pesquisa Global de Empresas Familiares da PwC, apenas 36% das empresas familiares sobrevivem à sua segunda geração - este dado reforça a necessidade de uma sólida governança, bem como de um processo sucessório bem definido. A indústria de family office tende a crescer no Brasil e no mundo, acompanhando o crescimento das empresas familiares que geram liquidez e que têm interesse em preservar seu capital ao longo do tempo.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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