Um economista de destaque na China afirmou que o país tem espaço para aumentar o apoio fiscal à economia emitindo até 10 trilhões de yuans (US$ 1,4 trilhão ou R$ 7,6 tri) em dívida especial, refletindo as crescentes expectativas de que Pequim expanda os gastos públicos como parte de seu pacote de estímulo.
Jia Kang, ex-chefe de um instituto de pesquisa afiliado ao Ministério das Finanças, disse que as autoridades poderiam aumentar a confiança elevando drasticamente o investimento governamental em projetos públicos. Ele falou em uma entrevista ao jornal chinês The Paper, publicada na terça-feira (1º).
"À medida que esses projetos forem iniciados, eles criarão empregos, aumentarão a renda dos cidadãos e liberarão o potencial de consumo", disse Jia, que agora lidera a China Academy of New Supply-Side Economics, um think tank privado. Sem fornecer um cronograma possível, ele afirmou que "aumentar a emissão de títulos agora para 4 trilhões ou até 10 trilhões de yuans não seria excessivo."
Os comentários se somam a uma discussão crescente sobre o que o Ministério das Finanças fará —ou deveria fazer —para impulsionar a segunda maior economia do mundo, após Pequim sinalizar seu desejo de superar a desaceleração do crescimento.
O seleto Politburo (comitê do partido comunista) de 24 membros incentivou os funcionários a emitirem títulos soberanos especiais de ultra-longo prazo e notas especiais locais para impulsionar o investimento, sem dar detalhes, alimentando especulações sobre a força das medidas fiscais.
A emissão de dívida sugerida por Jia seria múltiplas vezes maior que o 1 trilhão de yuans (R$ 777,5 bi) em títulos soberanos especiais de ultra-longo prazo que o governo planejava vender este ano. Mas ele disse que isso seria um aumento proporcional em relação ao pacote de estímulo de 4 trilhões de yuans em 2008, dado que o PIB (Produto Interno Bruto) da China quadruplicou em termos nominais até o final de 2023.
"Usar adequadamente os mecanismos de dívida pública não sobrecarregará o governo", disse ele ao The Paper. "Títulos governamentais de longo e ultra-longo prazo, com vencimentos de 30 a 50 anos, oferecem flexibilidade significativa e valem a pena, permanecendo dentro de limites seguros."
A Reuters informou na semana passada que o Ministério das Finanças está planejando emitir 2 trilhões de yuans (R$ 1,5 tri) em títulos soberanos especiais este ano. Esse financiamento será dividido igualmente entre estimular o consumo e ajudar os governos locais a enfrentar problemas de dívida, disse a agência.
As ambições delineadas por Jia são "realistas", de acordo com Becky Liu, chefe de estratégia macroeconômica da China no Standard Chartered. "Isso é mais sobre a disposição de apoiar, não tanto sobre a quantidade —se não for suficiente, haverá mais até que seja", disse ela.
Economistas do HSBC estimam que o estímulo fiscal direto totalizará 1 trilhão de yuans, com um pacote potencial dividido entre impulsionar o consumo e financiar grandes projetos. O montante total pode ser o dobro disso ou mais, incluindo fundos para recapitalizar bancos para fortalecer grandes credores, escreveram economistas, incluindo Jing Liu, em uma nota nesta quinta-feira (3).
A onda de estímulos de Pequim impulsionou uma alta nas ações, com o índice de referência CSI 300 atingindo seu máximo desde 2008 na segunda-feira (30), antes de o país entrar em um feriado de uma semana. Um índice de empresas chinesas listadas em Hong Kong subiu por 13 sessões consecutivas com otimismo em relação aos estímulos, até uma retração nesta quinta, quando caiu 1,58%.
O Danske Bank chamou os esforços de as maiores medidas de estímulo desde a crise financeira global, revisando sua previsão de crescimento para a China no próximo ano para 5,2% de 4,8%. O país gradualmente se tornará menos um fator desinflacionário global e mais uma força neutra à medida que a economia se estabiliza, disse o economista-chefe da China do banco, Allan von Mehren, em nota.
Agora, o foco está se voltando para qualquer apoio fiscal que venha. Economistas acreditam que são necessários maiores gastos para impulsionar a demanda doméstica, com a confiança do consumidor caindo para seu nível mais fraco em agosto desde novembro de 2022.
"No curto prazo, a política fiscal convencional é a chave a ser observada, pois o governo divulgará mais detalhes", escreveram os economistas do Macquarie, Larry Hu e Yuxiao Zhang, em uma nota na segunda-feira (30). "Mais tarde, em outubro, o governo pode anunciar mais cotas para títulos soberanos especiais ou títulos especiais de governos locais."
Em 2023, o principal órgão legislativo da China usou sua sessão de outubro para autorizar a emissão de 1 trilhão de yuans em títulos governamentais especiais adicionais.
O economista-chefe da China do Nomura, Lu Ting, disse que o governo poderia investir em mega projetos de infraestrutura, aumentar os gastos com segurança social e financiar diretamente projetos habitacionais atrasados —tornando-se efetivamente o "construtor de último recurso". Mas ele acrescentou que o governo teria que enfrentar algumas restrições ao considerar suas opções fiscais.
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"Pequim certamente lançará uma série de medidas fiscais e outras políticas de apoio, mas a escala e o conteúdo finais do pacote fiscal podem ser bastante improvisados e incertos devido à bolha de ações em formação e aos debates ainda controversos sobre o que Pequim deve focar", escreveu Lu em uma nota.
Economistas do Morgan Stanley, incluindo Chetan Ahya, ecoaram a cautela, citando fatores como o atual fardo da dívida do país. A relação dívida/PIB da China subiu para um recorde de 286% no início deste ano, de acordo com dados do banco central e do escritório de estatísticas compilados pela Bloomberg.
"A demanda por expansão fiscal só aumentará a partir daqui", escreveram Ahya, economista-chefe da Ásia, e outros em nota. "Embora não haja um limite rígido sobre o quão expansionista a política fiscal pode ser, acreditamos que os formuladores de políticas podem estar naturalmente hesitantes em fornecer acomodações significativas no contexto de déficits fiscais amplos e níveis elevados de dívida pública."