Candidatos ao CFM se resvalam em polarização política em campanha para conselheiros

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Candidatos às eleições do CFM (Conselho Federal de Medicina) em São Paulo usam figuras e polarização política em suas campanhas, feitas principalmente via redes sociais. Também descrevem pouco engajamento de médicos eleitores na semana que antecede as votações.

A definição dos novos conselheiros federais será online e está marcada para os dias 6 e 7 de agosto. O voto é obrigatório para todos os médicos registrados no conselho com menos de 70 anos.

Cada estado e o Distrito Federal vão eleger um conselheiro titular e um suplente para os próximos cinco anos. A AMB (Associação Médica Brasileira) também indica dois médicos para compor o grupo. As quatro chapas paulistas são 1) "JUNTOS por uma categoria médica mais forte", 2) "Força Médica", 3) "ConsCiência CFM" e 4) "Experiência e Inovação".

Titular da chapa 1, o presidente da Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular, Armando de Carvalho Lobato, diz que o CFM deve ser apartidário, mas para que ele seja de fato atuante "é preciso ter trânsito político, conhecimento e penetração em instituições".

Em uma publicação nas redes da candidatura, Lobato critica o PT (Partido dos Trabalhadores). Três prefeitos do PL no estado de São Paulo endossaram a campanha da chapa em vídeos, além do deputado estadual André Bueno (PL) e o irmão do ex-presidente Jair Bolsonaro, Renato Bolsonaro, pré-candidato a prefeito de Registro (SP) pelo PL.

Outros líderes do estado também são mencionados nos conteúdos, como o senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) e o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB). "Nós podemos mudar as leis", escreveu a chapa em seu documento de propostas.

Na semana passada, o CFM acionou a Polícia Federal após a circulação de postagens em redes sociais e mensagens de texto usando a marca do conselho para apoiar candidatos. As publicações continham peças gráficas que imitavam a identidade visual da entidade e mensagens contrárias ao presidente Lula (PT).

Na campanha, as chapas 1 e 2 se declararam contra o aborto após 22 semanas, assim como o procedimento de assistolia fetal. "A chapa 1 é firmemente a favor da vida, mas também respeitamos as leis vigentes no Brasil. Em casos previstos pela lei, como estupro, risco de vida para a mãe, ou anencefalia do feto, a mulher deve ser ouvida e ter a decisão final", diz Lobato.

O aborto virou tema no CFM após resolução do conselho que tentou proibir a assistolia fetal, um procedimento recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para interrupção de gestações tardias. A resolução foi motor para o PL 1904, que tenta equiparar a pena para aqueles que cometem o aborto à reclusão prevista em caso de homicídio simples.

Críticos apontam para o envolvimento da entidade em debates considerados político-ideológicos. Em junho, o presidente José Hiran Gallo se pronunciou contra a assistolia fetal, afirmando que há limites para a "autonomia da mulher". E em janeiro, a abertura de uma discussão sobre a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid em crianças de seis meses a menores de cinco anos causou discussão no meio médico.

Em 2022, o CFM restringiu a prescrição de CBD medicinal. E, em 2021, a Defensoria Pública da União processou o o conselho por chancelar do uso de hidroxicloroquina no tratamento de pacientes com Covid. O medicamento é comprovadamente ineficaz contra a doença, e o uso também foi defendido pelo então presidente Jair Bolsonaro.

O infectologista Francisco Cardoso, titular da chapa 2 e vice-presidente da ANMP (Associação Nacional dos Peritos Médicos Federais), descreve a Força Médica como "uma chapa de direita conservadora". Diz que política na disputa do CFM é indissociável, afinal é uma eleição, mas se declara "totalmente contrário" a política partidária.

No perfil da Força Médica, o empresário Luciano Hang e o ex-ministro da Saúde Marcelo Queiroga pedem votos para a chapa. O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) também expressou seu apoio no X, antigo Twitter.

Cardoso é um dos alvos de um pedido de investigação do Ministério da Previdência sobre a atuação do CFM em benefício da ANMP. "O Ministério da Previdência basicamente quer que os médicos peritos sejam proibidos de poder recorrer ao CFM. O nome disso é censura", disse ele sobre o caso.

As redes da ConsCiência CFM e Experiência e Inovação, se declaram contrárias à politização nas eleições do conselho, e sua campanha não conta com figuras políticas.

"O CFM traz normativas da prática médica, realiza fiscalizações, investigações importantes de denúncias, então esse envolvimento político-partidário deve ser repudiado pelos médicos", diz a pediatra Melissa Palmieri, vice-presidente regional da SBim (Sociedade Brasileira de Imunizações) em São Paulo e titular da chapa 3.

Palmieri afirma que vê pouco engajamento por parte de médicos. "É uma preocupação que nós temos devido ao desconhecimento de muitos colegas com essa eleição tão importante".

Ela e o titular da chapa 4, o cirurgião geral e professor da Santa Casa Paulo, Roberto Corsi, também criticam o Cremesp (Conselho Regional de Medicina em São Paulo por não divulgar o suficiente a votação e seus candidatos. "Os médicos não estão sendo informados das opções. E pior, muitos médicos nem sabem que vai ocorrer a eleição", declara Corsi.

O Cremesp disse, em nota, que está fazendo "ampla divulgação" da votação aos 187.675 médicos ativos do colégio eleitoral de São Paulo. "O Cremesp não concorda com o apoio político a chapas que estão na disputa eleitoral do CFM. Se o político é médico, ele tem o direito de apoiar como pessoa física, mas sem se associar a nenhum partido."

O presidente do CFM afirma, em nota, que "está trabalhando ativamente" desde abril para engajar os médicos brasileiros nas eleições deste ano, com pelo menos 15 emails de marketing, conteúdo nas redes e mensagens em grupos de WhatsApp. Ele não respondeu sobre a politização de campanhas até o momento de publicação da reportagem.

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