Em MP (medida provisória) publicada no Diário Oficial nesta quinta-feira (9), o presidente Lula estabeleceu o pagamento de R$ 60 mil a cada família de crianças com deficiência decorrente de síndrome congênita associada à infecção pelo vírus zika.
Na mesma edição do documento, o governo federal vetou o projeto de lei 6.064/23, aprovado pela Câmara dos Deputados no início de dezembro passado, que trata de uma pensão mensal indenizatórias às crianças vítimas do zika.
O projeto prevê que, além da indenização por dano moral no valor de R$ 50 mil, as crianças vítimas do zika devem receber uma pensão mensal e vitalícia conforme o teto do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), equivalente a R$ 7.786,02.
A decisão do veto do projeto e a edição da medida provisória desencadearam protestos de associações que representam as famílias dessas crianças. Segundo Germana Soares, presidente estadual da União de Mães de Anjos em Pernambuco, o projeto passou pela Câmara, por todas as comissões do Senado e foi aprovado por unanimidade de votos.
"Ao chegar para sanção presidencial recebemos esse veto sem nenhuma oportunidade de negociação e fomos surpreendidas com uma medida provisória de baixo escalão como se a vida e o sofrimentos dos nossos filhos e as sequelas que o zika causou por quase dez anos e todos prejuízos financeiros, emocionais e físicos fossem pagos com R$ 60 mil", diz ela, mãe de Guilherme de 9 anos com microcefalia decorrente do zika vírus.
De acordo com a medida provisória, o valor deverá ser pago em parcela única para casos em que a deficiência de síndrome congênita tenha sido causada pela infecção da mãe da criança durante a gestação, no período entre 1º de janeiro de 2015 e 31 de dezembro de 2024.
A MP ainda precisa ser aprovada pelos plenários da Câmara e do Senado para se tornar lei em definitivo. O prazo de vigência da medida provisória é de 60 dias, prorrogável uma vez por igual período.
"O governo federal não está dando nada, não autorizou nada [de ajuda às crianças até então] e sai com essa MP excludente e limitadora trazendo frustração e decepção para mães e familiares", diz Germana.
Segundo ela, a frustração não é apenas com o veto, mas com a falta de oportunidades de negociação e de diálogo. Ela diz que 1.589 famílias de crianças com deficiências graves causada pelo zika sobrevivem hoje em situação de miserabilidade.
"Como eles pensam que 60 mil iriam nos calar? Vamos trabalhar para que o veto seja derrubado no Congresso."
Para Luciana Arraes, presidente do UniZika Brasil, o presidente Lula cometeu um erro irreparável ao vetar integralmente o projeto de lei. "Em uma tentativa de remediar esse veto, o presidente optou por publicar uma medida provisória que, na prática, serve apenas como um cala-boca para as mães, tentando silenciá-las e minimizar o impacto de sua decisão."
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De acordo com ela, a medida provisória foi editada sem ouvir as reais necessidades das mães e das famílias. "Nós, mães, estamos extremamente tristes, frustradas e decepcionadas. Mas a luta não vai parar. São quase dez anos de negligência, descaso e esquecimento dessas famílias."
Segundo o texto da medida provisória, para conseguir a indenização, será obrigatória a comprovação de que a síndrome congênita foi causada pela contaminação da mãe pelo vírus durante a gestação.
O apoio financeiro não é acumulável com qualquer indenização da mesma natureza concedida por decisão judicial. A medida informou ainda que a concessão do apoio financeiro fica sujeita à disponibilidade orçamentária e financeira.
A explosão de casos de microcefalia em crianças associada ao zika vírus aconteceu entre 2015 e 2016, quando foram notificados 12.716 casos suspeitos. À época, a epidemia de zika se espalhou para 60 países.
De acordo com um estudo publicado pela revista científica The Lancet Regional Health - Americas, mais de 30% das crianças nascidas de mães infectadas pelo vírus zika durante a gravidez apresentaram microcefalia ou outras anormalidades neurológicas, oftalmológicas e de neuroimagem, em decorrência da infecção.
O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promoção da saúde