O choque de juros anunciado ontem pelo Comitê de Política Monetária (Copom), com a decisão de acelerar a alta da Selic para 1 ponto percentual e praticamente contratar mais dois incrementos na mesma magnitude no início de 2025, deve ajudar na transição de comando do Banco Central.
Na opinião de economistas, a nova diretoria, a ser comandada por Gabriel Galípolo, vai ganhar tempo e começar a trabalhar num ambiente de mais credibilidade enquanto o ajuste está sendo feito.
Segundo o chefe de economia para Brasil e de estratégia para América Latina do BofA, David Beker, a entrega do bastão com o novo cenário mais restritivo ajuda na transição, “de sair de um cenário Roberto Campos Neto para um cenário de Galípolo.
Mas ele disse que será preciso esperar um tempo até que a ancoragem das expectativas de inflação, que é um processo que não acontece de uma hora para outra. “Tem que dar tempo ao tempo. Em qual nível vai ser ancoragem é difícil de saber”, comenta.
Para Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, o movimento agressivo do BC teve dois objetivos: o primeiro foi dar um choque de credibilidade, mostrando que o BC vai fazer de tudo para trazer a inflação para a meta, independentemente da postura fiscal do governo. “Seria o ‘whatever it takes’ 2 do nosso BC, comenta, citando uma expressão muito usada pelo presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell.
O segundo objetivo é dirimir as dúvidas com relação à postura do BC quando da mudança da sua diretoria e, principalmente, do seu presidente. “Já temos contratada uma Selic a, no mínimo, 14,25% a.a.. Pode subir mais? Pode. Os nossos cálculos, com o dólar acima de R$ 6,00 e as expectativas de inflação desancoradas como estão, poderia chegar próximo de 17,00% a.a..”, estima.
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Mas ele pondera que a estratégia do choque só funciona se tiver impacto sobre as expectativas do mercado, causando um círculo virtuoso, onde o real se aprecia frente ao dólar e as taxas da parte longa da curva de juros futuros caem.
Na opinião de Luis Cezario, economista chefe da Asset 1, a sinalização foi positiva, porque mostrou a disposição do comitê de levar a Taxa Selic mais rapidamente para um patamar suficientemente contracionista.
“Além disso, entendemos que a comunicação adotada facilita a transição no banco central ao indicar o novo presidente do Banco Central dará continuidade à estratégia definida na última reunião comandada pelo atual presidente da autarquia.”
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Apesar de considerar que o Copom agiu corretamente ao ser mais hawkish nesta quarta-feira, Alexandre Espirito Santo, coordenador de economia e finanças da ESPM e economista da Way Investimentos, lembra que controlar as expectativas é uma tarefa dificílima nesse momento e colocará os holofotes sobre o novo Copom, que assume a partir de janeiro.
“Os mercados cobrarão a devida autonomia da instituição para a consecução da meta, como, aliás, ficou subentendido no comunicado de hoje”, afirma
O planejador financeiro Idean Alves, acredita que, nas próximas reuniões, com Gabriel Galípolo na presidência do BC, o Copom deve continuar vigilante, e com menor apetite a alta de juros, se a inflação assim permitir.
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Para ele, há uma grande interrogação se Galípolo vai manter o pulso firme assim como Campos Neto. “Mas a história recente da década passada e do pós-pandemia mostra que a inflação é o inimigo global do século até aqui, e que se não for combatida com o remédio amargo da alta de juros, haverá nos próximos anos mais renda circulando, porém com menos poder de compra, o famoso ‘ganha mais não leva’, o qual terá um impacto grande sobre a classe baixa e a classe média no geral.”