Animais de 603 espécies atuam como arquitetos e modificam a paisagem da Terra

há 3 semanas 7

Ao construírem tocas e diques, ou simplesmente ao se deslocarem, alguns animais como as formigas, os castores, os salmões, as toupeiras e os hipopótamos esculpem o planeta e, coletivamente, modificam as paisagens do mesmo modo que as grandes inundações, revela um estudo de uma universidade londrina.

"Sempre nos interessamos pelos animais de forma individual. Com esse estudo, descobrimos a importância coletiva dos animais arquitetos", afirma à AFP Gemma Harvey, pesquisadora em geografia física que dirigiu um estudo da Universidade de Londres Queen Mary sobre o tema. O trabalho foi publicado no dia 18 do mês passado no periódico PNAS.

No total foram identificadas 603 espécies terrestres e de água doce como responsáveis por um impacto real nas paisagens, entre os quais camarões na América do Sul, marsupiais na Austrália, grandes herbívoros na África, cupins e formigas na Ásia, vermes de terra, ursos e insetos de água doce na Europa.

"Ao estimar a energia coletiva desses animais, descobrimos que rivalizava com outras forças importantes que moldam a paisagem, como as inundações", diz a pesquisadora britânica.

Segundo o estudo, os animais identificados contribuem coletivamente com cerca de 76 mil gigajoules de energia para os processos geomorfológicos todos os anos, o que a equivale à energia mobilizada em mais de 500 mil grandes inundações de rios ou 200 mil temporadas de monções.

Do elefante aos cupins

Entre essas espécies, estão gigantes da fauna como o elefante, o urso-cinzento e o hipopótamo.

Segundo Harvey, ao pisotear e se deslocar entre o local onde dorme e o local onde se alimenta, o mamífero, que pode pesar até 1,5 tonelada, pode criar novos canais fluviais.

Outro bom exemplo são os castores. "Criam muitos habitats, mas também podem ajudar a mitigar as inundações ou a revitalizar rios com baixo fluxo de água durante períodos de seca", diz a pesquisadora.

Na República Tcheca, um grupo de castores reabilitou no início do ano um terreno militar onde as obras haviam sido paralisadas durante sete anos, criando diques e meandros que formaram uma zona úmida favorável para a proteção de lagostins, fazendo a comunidade economizar um milhão de euros no processo.

Além dessas espécies familiares, de acordo com Harvey, tendemos a subestimar os animais pequenos que são menos visíveis, porque vivem sob a terra ou sob a água, mas que são tão importantes quanto.

O exemplo mais impressionante se encontra no Brasil, onde colônias de cupins construíram milhares de montículos conectados entre si por túneis, em uma superfície equivalente à da Grã-Bretanha.

"É uma enorme quantidade de solo que esse animal desloca", destaca a especialista, que recorda que são construções visíveis até do espaço.

"Há muitos animais que ainda não foram estudados ou que sequer foram descobertos. Sabemos que ainda há milhões de insetos a serem descobertos. Também não estudamos os ecossistemas marinhos", diz a pesquisadora.

Ameaçados

Segundo o estudo, mais de 25% das espécies identificadas como animais construtores (28%) são raras ou endêmicas e 57 delas são consideradas em perigo de extinção segundo a Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN).

"À medida que perdemos espécies, perdemos esses processos únicos" e, em consequência disso, o equilíbrio dos ecossistemas, lamenta Harvey, que também considera que ainda falta conhecimento sobre os processos em si.

A pesquisadora propõe prolongar os estudos integrando os efeitos da mudança climática. "Estamos refletindo sobre o que já foi perdido em nossas paisagens à medida que as espécies foram extintas ou que as populações diminuíram drasticamente."

Decidida a oferecer novas perspectivas para a conservação da biodiversidade, Harvey espera que esse tipo de estudo influencie nos programas de reintrodução de espécies essenciais para reduzir os fenômenos climáticos extremos.

Leia o artigo completo