"Esta grande cidade de Temixtitán foi fundada nesta lagoa salgada... Ela tem quatro entradas, todas com calçadas feitas a mão, com a largura de duas lanças de cavaleiros. É uma cidade tão gloriosa quanto Sevilha e Córdoba [na Espanha]."
"Suas ruas principais são muito largas e retas. Algumas delas e todas as demais são metade de terra, metade com água, onde eles andam com suas canoas."
Foi assim que o explorador espanhol Hernán Cortés (1485-1547) descreveu a cidade de México-Tenochtitlán (Temixtitán, segundo seu entendimento), em um dos mais antigos relatos escritos (1520) de como era o centro político e social dos mexicas, como também eram chamados os astecas que viviam no sul do México e na América Central.
México-Tenochtitlán e sua cidade-gêmea, México-Tlatelolco, causaram assombro aos espanhóis, devido ao seu avançado grau de urbanização.
"Essa cidade tem muitas praças, onde existem mercados permanentes e trabalhos de compra e venda", prossegue Cortés.
"Ela tem outra praça, com cerca do dobro do tamanho da cidade de Salamanca [na Espanha], toda cercada por portais ao seu redor, onde, todos os dias, há mais de 70 mil almas comprando e vendendo; onde há todos os gêneros de mercadorias encontrados em todas as terras, desde mantimentos e víveres, até joias de ouro e prata, chumbo, latão, cobre, estanho, pedras, ossos, conchas, caracóis e plumas."
No momento da sua chegada, a cidade vivia uma das suas épocas de maior esplendor.
Os mexicas haviam fundado México-Tenochtitlán mais de dois séculos antes da chegada dos espanhóis. Neste período, eles se tornaram a maior potência militar da Mesoamérica —a região política e cultural onde, hoje, fica o centro e sul do México.
O ano de fundação da cidade é motivo de debates entre os especialistas. Mas se acredita que possa ter ocorrido na primeira metade do século 14.
Na época moderna, o governo mexicano fixou uma data para sua fundação: 13 de março de 1325. Por isso, a antiga cidade pré-hispânica, que viria a se tornar a Cidade do México, comemora em 2025 seus 700 anos.
"O império estava em sua expansão máxima. A cidade detinha sua maior riqueza", conta à BBC News Mundo (o serviço em espanhol da BBC) Federico Navarrete, especialista em história da América pré-hispânica e pesquisador da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam).
Cortés e outros cronistas da época produziram descrições verbais e representações gráficas da cidade. Mas, nos últimos cinco séculos, a imagem mais detalhada foi a publicada em 2023, pelo desenvolvedor de software holandês Thomas Kole.
Ele passou um ano e meio liderando um projeto chamado "Retrato de Tenochtitlán", o trabalho mais detalhado sobre a cidade mexica já publicado. Ele oferece uma perspectiva única de qual teria sido a aparência da metrópole pré-hispânica.
"É fascinante observar o que eles inventaram: seu conceito de cidade, como a organizaram e a distribuíram", destaca Kole. Uma de suas especialidades é a modelagem artística tridimensional por computador.
O coração do domínio mexica
Além das descrições de Cortés, outra das crônicas mais comentadas sobre Tenochtitlán é a do frade espanhol Bernardino de Sahagún (1499 - 1590). Ele descreve como os europeus ficaram surpresos quando encontraram México-Tenochtitlán e os locais ao seu redor.
"Vimos coisas tão admiráveis que não sabíamos o que dizer, nem se era verdade o que aparecia à nossa frente. De um lado, em terra, havia grandes cidades e, na lagoa, outras tantas."
"Víamos tudo repleto de canoas e, nas calçadas, muitas pontes entre um trecho e outro. E, adiante, estava a grande cidade do México", descreveu o frade espanhol.
Cinco séculos depois, a Cidade do México e sua zona metropolitana enfrentam sérios problemas relacionados à água.
A região tem 20 milhões de habitantes. De um lado, ela enfrenta secas que obrigam sua população a limitar o consumo de água potável. De outro, as fortes precipitações da estação das chuvas geram sérias inundações em regiões onde, antes, havia canais naturais.
"A forma atual de gestão não tem nenhuma relação com o modo praticado pelos mexicas e por outros povos pré-hispânicos", explica Navarrete.
"O que ocorreu foi um ecocídio cometido pelos espanhóis e pelos governos mexicanos. O afundamento ocorre porque retiramos toda a água do vale."
A extração da água do subsolo gerou um problema de afundamento da cidade, que se agrava ano após ano.
"A Cidade do México é um símbolo de como não se pode vencer a água", segundo Kole. "Ela é mais forte que nós. "Você pode tentar dominá-la, mas nunca irá vencê-la."
"Acredito que essa seja uma lição que também aprendemos na Holanda. Nós aprendemos a aceitar a água e dar a ela o espaço de que ela precisa, criando um entorno mais saudável."
"Espero que o México consiga se reconciliar com isso", prossegue Kole. "A Cidade do México é um belo lugar, com uma identidade forte e única, diferente de qualquer outro local. Acredito que ela mereça existir, tem esse direito."