Trump mira transporte marítimo chinês e arrisca choque para empresas

há 4 horas 1

A administração Trump abriu uma nova frente ampla em seu conflito comercial global, propondo a aplicação de taxas que podem chegar a US$ 1,5 milhão em navios fabricados na China que chegam aos portos americanos.

Essas taxas se aplicariam mesmo a embarcações feitas em outros lugares, se forem operadas por transportadoras cujas frotas incluam navios chineses —uma abordagem que corre o risco de aumentar os custos de uma variedade de cargas importadas, desde matérias-primas até produtos manufaturados.

Dado seu potencial para aumentar os preços ao consumidor, as taxas poderiam colidir com as promessas do presidente Donald Trump de combater a inflação. Quase 80% do comércio exterior americano em peso é transportado por navio, mas menos de 2% é realizado em embarcações com bandeira americana, de acordo com a Gavekal Research.

Conforme detalhado na sexta-feira (21) pelo Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos, a proposta reflete o mantra "America First" ("América em primeiro lugar", na tradução) que anima a administração Trump. A ideia é projetada para desencorajar a dependência de navios chineses no fornecimento de produtos aos americanos, enquanto visa estimular o renascimento da indústria de construção naval doméstica após meio século de verdadeira dormência.

Juntamente com as tarifas expansivas de Trump, a abordagem ao transporte marítimo é uma repreensão ao sistema comercial construído pelos EUA e seus aliados após a Segunda Guerra Mundial. A fé na visão do mundo como um mercado fervilhante deu lugar à hostilidade em relação à globalização em favor da busca pela autossuficiência.

A proposta avançaria a missão de isolar a China e diminuir a dependência americana de sua indústria —uma rara área de consenso bipartidário em Washington. O plano foi o resultado de uma investigação, iniciada durante a administração Biden, sobre o domínio da indústria de transporte marítimo chinesa, em resposta a uma petição apresentada por sindicatos.

Quase um quinto dos navios porta-contêineres que chegam aos portos americanos são fabricados na China, e uma parcela muito maior nas rotas comerciais que atravessam o Pacífico, de acordo com o gigante bancário holandês ING.

"Uma parte significativa das importações que entram nos EUA via portos estaria diretamente sujeita a pesadas multas", concluíram os pesquisadores do banco em um relatório publicado na segunda-feira (24). "Essas despesas adicionais provavelmente seriam repassadas do transportador para os remetentes e, em última análise, para importadores e exportadores."

A administração está recebendo comentários sobre a proposta até 24 de março. Trump poderia então impor as taxas por ordem executiva.

O plano prevê uma gama de taxas sobre navios que descarregam em portos americanos, dependendo da porcentagem de embarcações fabricadas na China na frota da transportadora. Além da taxa de até US$ 1,5 milhão para navios construídos na China, ele delineia taxas que chegam a US$ 1 milhão por escala em porto para transportadoras cujos pedidos de novos navios dependem fortemente de estaleiros chineses.

As principais transportadoras geralmente param em dois ou três portos americanos por rota, o que significa que suas taxas poderiam exceder US$ 3 milhões em viagens que geram de US$ 10 milhões a US$ 15 milhões em receita, estimou Ryan Petersen, CEO da empresa global de logística Flexport.

"As taxas propostas são enormes, e elas serão incorporadas ao que os remetentes têm que pagar, e, portanto, aos consumidores", disse Willy Shih, especialista em comércio internacional da Harvard Business School. "É um movimento realmente agressivo que reflete uma administração que ou está fora de sintonia com a realidade de como o mundo realmente funciona ou que não se importa e quer causar caos."

A agitação pode se adequar aos planos de Trump, que procurou pressionar as empresas a fabricar seus produtos nos EUA. Mas o aumento dos custos de transporte pode dificultar esse esforço, dado que mais de um quarto das importações americanas são componentes, peças ou matérias-primas, de acordo com dados do Banco Mundial. Custos mais altos em tais cargas desafiam a economia de fabricar produtos acabados nos EUA.

A proposta de Trump visa combater o domínio da indústria de construção naval chinesa, que fabrica mais da metade dos navios de carga comercial do mundo, em comparação com 5% em 1999, de acordo com o Escritório do Representante de Comércio dos EUA.

Pelo menos 15% das exportações americanas teriam que ser transportadas em embarcações com bandeira dos EUA dentro de sete anos da nova política, e 5% das frotas teriam que ser construídas nos EUA.

China, terra do meio

Receba no seu email os grandes temas da China explicados e contextualizados

"Não há maneira física de que os estaleiros dos EUA possam fazer isso", disse Lars Jensen, CEO da Vespucci Maritime, uma consultoria de transporte marítimo de contêineres com sede em Copenhague, Dinamarca. "O termo técnico para essa proposta seria simplesmente 'estúpida'."

A espera por um novo navio porta-contêineres de um estaleiro existente já se estende por mais de três anos, disse ele. A indústria americana estaria começando quase do zero, exigindo bilhões de dólares e muitos anos.

O esforço também exigiria aço —mercadoria tornada mais cara pelas tarifas de Trump.

Enquanto isso, as taxas criariam novas oportunidades para estaleiros estabelecidos na Coreia do Sul e no Japão.

Se implementada, a proposta embaralharia o transporte internacional, semeando incertezas adicionais para empresas já lidando com várias propostas tarifárias de Trump.

Os importadores provavelmente reduziriam o uso de portos americanos enviando para o México e Canadá, e depois usando caminhões e trens para entregar nos EUA.

"Esses portos costumam estar congestionados", disse Petersen. "Eles não serão capazes de absorver muita capacidade."

Leia o artigo completo